Mineiro, segundo Fernando Sabino, não perde o trem. Viajando pela estrada de ferro Vitória-Minas, em outubro passado, percebi, além disso, que o bom mineiro não perde a oportunidade de acenar quando a locomotiva passa. Foram 664 quilômetros, de Belo Horizonte a Cariacica, sendo prontamente e amigavelmente atendido toda vez que erguia o braço.
A viagem, muito mais do que uma ode à mineiridade, é cheia de surpresas. E, ao contrário do que supõe a longa extensão e a duração de 13 horas, é agradável. Isso, claro, se se optar pela classe executiva (R$ 87), em vez da econômica (R$ 56). São vagões com ar condicionado e cadeiras macias, iguais as de ônibus.
Você embarca em Belo Horizonte às 7h30, se surpreende com a bonita paisagem em Sabará, fica horrorizado com a devastação das mineradoras um pouco mais à frente, em Barão de Cocais, às 9h. Vai ao vagão-restaurante, toma um café com pão e manteiga (custa por volta de R$ 3). Falta pouco para um garçom passar anotando os pedidos do almoço: o preço é convidativo, com opções que vão de filé de frango (R$ 13), carré (R$ 14) à deliciosa picanha (R$16), todos acompanhados de arroz, feijão, batata frita e farofa.
Os rios são os companheiros de quase toda viagem. Pela manhã, o Rio Piracicaba. À tarde, o Rio Doce, com seus bancos de areia e água de cor barrenta. Depois do almoço, que pode ser servido no restaurante ou na poltrona, um cochilo até chegar a Governador Valadares, às 14h, o meio da viagem.
Ao passo que o trem vai descendo rumo ao Espirito Santo, a tarde cai. Pela janela, se vê a rotina de pequenas cidades e vilarejos: Galiléia, Conselheiro Pena, Resplendor, Aimorés … sobe e desce nas estações, mãe buscando criança na escola, aposentados proseando na praça. Ao contrário do que estamos acostumados em relatos orais, músicas ou na literatura mineiriana, as 29 estações (ou simples paradas) não são cheias de romantismo. São trocas rápidas e práticas, com gente correndo para visitar parentes, trabalhar ou ir ao médico – poucos são os viajantes a turismo.
O trem cruza a divisa lá pelas 17h. Boa hora para mais um cafézinho e uma ida ao vagão de leitura, para carregar o celular, ler um trecho de livro ou, para quem prefere, trabalhar um pouco no notebook – a falta de wi-fi é o ponto negativo. O maquinista avisa para fechar as janelas, já que, na falta de coisa melhor a se fazer, costumam jogar pedras nos vagões.
Às 20h30, entre cotoveladas, abraços, malas e bugingangas, o desembarque.