segunda-feira, junho 30, 2008

Menos Bandit e mais Langlois!


por Renan Damasceno
especial para o Cinema em Cena
*

Há milhares de clichês tentadoramente românticos esperando para serem usados quando o assunto é Maio de 1968: liberdade, revolução e utopia são palavras quase obrigatórias em reportagens e artigos sobre a mobilização dos estudantes franceses no final da década de 1960. Quarenta anos depois – com o tamanho do biquíni menor e o legado do consumo de drogas infinitamente maior –, os protestos daquele ano são constantemente lembrados e retomados como um alerta à passividade da juventude deste início de milênio. Liberdade, revolução e utopias à parte, é difícil responder se o sonho acabou ou não. E o pior: parafraseando Ivan Lessa, em quatro décadas, nem os próprios franceses decidiram se Maio de 1968 foi bom ou ruim.

* Leia o artigo na integra:

Menos Bandit e mais Langlois

segunda-feira, junho 23, 2008

Durango Kid à brasileira

De uísque em uísque, o cantor Waldick Soriano, de 75 anos e incríveis 18 ‘casamentos’, se tornou o protagonista cult da noite de sábado do CineOP. Compositor de mais de 700 canções, Waldick é uma mistura de presente e passado, de fragilidade e solidão, sob à penumbra da idade e de seu inseparável chapéu.

A principal noite do CineOP (Mostra de Cinema de Ouro Preto) parece ter virado um bom terreno para personalidades que se aventuram a sentar na cadeira de diretor. Em 2007, a Vj Marina Person (MTV) usou o mesmo espaço para lançar Person, uma homenagem a seu pai, o cineasta Luis Sérgio Person, diretor de São Paulo S.A (1965). Este ano foi a vez da atriz Patrícia Pillar, que mostra seu primeiro trabalho atrás das câmeras com “Waldick: Sempre no meu coração”, sobre a história e as histórias do cantor brega Waldick Soriano, já com 75 anos.

Considerando as primeiras incursões em direção de cinema, Patrícia Pillar se saiu melhor. Desconstruiu o perfil machão de Waldick, não deixou o roteiro cair em um simples biografismo e usou o tempo a seu favor: em 58 minutos de filme, foi capaz de dosar o sentimentalismo quase inexistente do cantor com seu excesso de sarcasmo e mau humor.

O filme já começa com algumas evocações ao tempo. Waldick volta a sua terra (Caitité, BA) natal para um show. Nas primeiras cenas, a câmera percorre detalhes do cantor e de objetos que dão pistas sobre sua forte personalidade: o terço, o anel, o chapéu. Os planos das estradas, das ruas e da chuva são sempre mais longos. Outra característica: ao contrário de documentaristas viciados, que teimam em dar grandiosidade ao seu personagem, Patrícia coloca a câmera sempre em linha reta. Desta forma, se põe a desmistificar seu protagonista, dando-lhe ares mais humanos.

Os depoimentos de ex-mulheres de Waldick são de grande emoção. No total, foram 18 mulheres e apenas uma paixão: uma ex-prostituta paraense, que morreu quando o casal completava apenas dois meses. E o espantoso: mesmo com as queixas de amor não retribuído todas ainda são apaixonadas pelo cantor e o aceitariam de novo.

Por fim, o documentário se presta a divulgar não só o personagem, mas toda a cultura marginal brasileira. Vários cantores populares sofreram com a censura nos anos de chumbo e muitos, mesmo com músicas que a princípio pareciam inofensivas, eram politizados e não escondiam sua opção pela democracia. Waldick foi mais brasileiro que muita gente da nossa “cultura popular brasileira”. Foi lavrador, garimpeiro, engraxate e se apaixonou, à primeira vista, ao ver o chapéu e a imponência do personagem Durango Kid nos cinemas. Sob o mesmo chapéu, hoje, Waldick é uma mistura de presente e passado, de fragilidade e solidão.

Leia mais sobre:

Revista Cinética – É tudo verdade

Filmes Polvo comenta estréia de Waldick

Veja cenas do documentário Waldick: para sempre no meu coração

Fique por dentro:

A Mostra de Cinema de Ouro Preto (12 à 17 de junho) chegou à sua terceira edição ainda sem a chancela de grande festival. No entanto, a programação foi bem mais acertada do que a de 2007, que homenageou Nelson Pereira dos Santos. Desta vez, Glauber Rocha e Rogério Sganzerla foram as personalidades lembradas. Além de "Waldick", de Patrícia Pillar, a mostra abriu espaço para outras estréias, como "Diário de Sintra", de Paloma Rocha (filha de Glauber), e "Os desafinados", ficção de Walter Lima Junior, em comemoração dos 50 anos da Bossa Nova.



terça-feira, junho 10, 2008

O cinema gritante de Ana Carolina


Renan Damasceno


Os filmes de Ana Carolina não devem ser assistidos em silêncio. A loucura das personagens é levada ao espectador de forma desconexa, feia e inquietante. Tudo é barulhento, caótico. Os atores parecem não respeitar um roteiro, falam o que querem e quando desejam (Mar de Rosas, 1977). As cenas são amareladas, como coisas que apodrecem e se decompõe, e embaçadas, como se as dúvidas e as inquietações das personagens causassem uma opacidade desesperadora na lente das câmeras.
Ana Carolina foi uma das maiores autoras do nosso cinema. E caiu no ostracismo. Ao contrário do cinema autoral alegórico de Glauber Rocha – nosso maior autor de cinema – e de outros estilos assinados por grandes diretores e fases do nosso cinema, Ana Carolina faz algo novo: eleva a loucura ao grau máximo em seu cinema. É tudo
manicomial e sem visível tratamento.
Ana Carolina Teixeira Soares nasceu em São Paulo, em 1949. Formou-se em Medicina e passou pelo curso de Ciências Sociais antes de estudar cinema em São Luiz (MA). Foi continuísta de Walter Hugo Khouri em As amorosas (1967) e dirigiu alguns curtas na década de 1970 antes de realizar seu primeiro filme, Mar de Rosas (1977), no qual agradou a crítica que o classificou como inventivo e desconcertante.


Filmografia:

2003 – Gregório de Mattos
2000 - Amélia
1987 - Sonho de Valsa
1982 – Das Tripas Coração
1977 - Mar de Rosas


Os três filmes abaixo formam a trilogia, considerada obra-prima da autora, que trata de mulheres deslocadas do seu contexto social.

Mar de Rosas (1977)


Sinopse: Mar de Rosas, estrelado por Cristina Pereira, Norma Bengell, Hugo Carvana e Otávio Augusto, é a história de uma mulher que, após assassinar o marido, foge com a filha e acaba entrando em um tenso e delirante jogo de manipulação, refletido na narrativa não-linear que conta com elementos surreais. O elenco de primeira ainda conta com Ary Fontoura e Myrian Muniz. (Cinema em cena)

Comentário: Assim como nos thrillers americanos, a trilha sonora alerta o espectador para os momentos crucias do filme: dita a mudança de ritmo e de estado de espírito das personagens. Além disso, conta com elementos surreais, como o monte de terra na sala de visitas. Destaque também para os diálogos, as reações inesperadas e mudança de temperamento dos protagonistas.

Das Tripas Coração (1982)

Sinopse: Um interventor dirige-se à reunião marcada para as cinco horas da tarde, num internato de meninas onde será formalmente determinado o encerramento das atividades por motivos administrativos e econômicos. Enquanto aguarda os cinco minutos que faltam, tira um rápido cochilo, durante o qual vive fantasias com as mulheres do estabelecimento. Sua imaginação é inicialmente estimulada pela conversa, na cozinha, de duas professoras, Miriam e Renata, sobre as verbas desviadas. Como professor Guido, o interventor se transporta a uma sala de aula, onde discursa sobre o homem, a mulher, a loucura e o moralismo, e passa a viver intensamente todos os problemas do colégio e as loucuras dos professores e alunas. Depois de participar de situações totalmente fora da normalidade, vê-se perseguido pelas serventes, quando o relógio bate as cinco horas e desperta o inspetor. As professoras surgem na sala de reunião, todos se apresentam e a ata que decreta o fim da instituição é assinada. (Adoro cinema brasileiro)

Comentário: Fenomenal atuação de Antônio Fagundes. Quem depois viu o ator em Deus é Brasileiro....

Sonho de Valsa (1987)

Sinopse: O amor que eu tenho pelo meu amor que eu ainda não tenho. Esta é Tereza começando seu Sonho de Valsa. Uma linda mulher, seus 30 anos e suas fantasias. A cruz que carrega no peito tem a marca do pai, seu primeiro amor. E o desejo que esconde atinge a todos os homens. Entre desesperos, desencontros e desejos, Tereza caminha sentindo-se cada vez mais abandonada, cada vez mais sozinha. Tereza deseja o amor. Os homens desejam Tereza. Um ex-namorado, um pretendente, um amigo do pai e até seu irmão...

Comentário: As cenas são uma mistura de Sagrado e profano. O filme é cheio de chavões e lugares comuns, como carregar a cruz, engolir sapos e fundo do posso. Esses chavões pontuam o desenrolar da trama, protagonizada por Xuxa Lopes, como Tereza. Ney Matogrosso faz o papel do irmão da protagonista.


Saiba + sobre Ana Carolina:

O inquietante cinema de Ana Carolina

Crítica de Luiz Carlos Merten (Estadão)

Aramis Millarch - Ana Carolina, a bela inimiga da embrafilme

Gregório – a origem da alma brasileira