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sábado, outubro 10, 2009

Tarja preta

O governo Kirchner aprovou ontem, após 14 horas de debate no Senado argentino, o texto-base para a nova lei de imprensa do país. A intenção, como ficou claro na invasão ao Clarín, mês passado, é enfraquecer os conglomerados de mídia - que são opositores ao governo de Cristina.

A nova lei de imprensa - que substituirá a atual, criada na ditadura (1976-1983) - pretende democratizar a produção de conteúdo no país. Até aí, tudo bem. Mas prevê também que nenhuma empresa privada poderá ter um canal aberto e outro fechado simultaneamente, restrição inédita no mundo, e que o sinal dos canais privados não poderão ultrapassar 30% do território. Apenas as tevês estatais chegarão a todos os lares argentinos. (Detalhes, aqui)

Governo e imprensa nunca se bicaram na América do Sul, seja em regimes democráticos, ditatoriais ou, mais recentemente, bolivarianos. Chávez não concedeu a renovação da concessão à RCTV, em 2006, e o único canal não-chavista da Venezuela, o Globovisión, é alvo de constantes intimidações. (Vale a pena assistir ao documentário A revolução não será televisionada, disponível aqui).

No mesmo caminho de repressão à imprensa seguem Rafael Corrêa (Equador) e Evo Morales (Bolívia). Corrêa, por exemplo, vive enchendo os canais El Universo e Teleamazonas de processos. Segundo ele, as duas redes são conspiradoras e golpistas. Aliás, um dos planos da criação da Unasul é fiscalizar os "abusos da imprensa", ideia compartilhada por Corrêa e Chávez.

Por mais que o Brasil se mantenha distante deste quarteto anti-imprensa, o Estadão está há 71 sob censura, proibido por uma liminar de noticiar o andamento dos processos na Polícia Federal contra a família Sarney - este, paradoxalmente, o maior opositor da entrada da Venezuela no Mercosul. A proibição veio do desembargador Dácio Vieira, amigo próximo do clã maranhense.

Aqui, a repressão trocou a farda pela toga.

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+ Imprensa e América Latina neste blog:

Honduras - Cobertura da Imprensa na crise
Cuba - À sombra de Fidel
México - Cabezas Cortadas
Chile/Brasil - Podres Poderes


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quarta-feira, março 11, 2009

Dita o quê?

Durante uma década e meia, a Folha ficou sob o comando da direita golpista e muitos dos seus jornalistas ocuparam cargos na Secretaria de Segurança Pública de São Paulo

Está no jornal paulistano Brasil de Fato desta semana:

O editorial da Folha de S.Paulo da semana passada, que qualificou a sanguinária ditadura militar brasileira de “ditabranda”, foi um tiro no pé. Em pleno carnaval, serviu para tirar sua fantasia de jornal eclético e plural, que até hoje engana alguns ingên uos. A balela publicitária de que a Folha “tem o rabo preso com o leitor” foi para o esgoto. Em poucos dias, dois mil leitores indignados assinaram um manifesto de repúdio ao jornal. Eduardo Guimarães, do blog Cidadania, já propõe realizar um ato de protesto em frente ao prédio do Grupo Folhas, na Rua Barão de Limeira.


Da própria redação, o jornalista Fernando de Barros e Silva resolveu se indignar - infelizmente, a maioria mantém o silêncio cúmplice: “Certamente não é a primeira vez que um colunista da casa diverge da posição expressa pelo jornal em editorial. Mas é a primeira vez que este colunista se sente compelido a tornar pública sua discordância... O mundo mudou um bocado, mas ‘ditabranda’ é demais. O argumento de que, comparada a outras instaladas na América Latina, a ditadura brasileira apresentou ‘níveis baixos de violência política e institucional’ parece servir, hoje, para atenuar a percepção dos danos daquele regime de exceção”.

Indignação e silêncio cúmplice – “Algumas matam mais, outras menos, mas toda ditadura é igualmente repugnante... Se é verdade que o aparelho repressivo brasileiro produziu menos vítimas do que o chileno e o argentino, isso se deu porque a esquerda armada daqui era menos organizada e foi mais facilmente dizimada, não porque nossos militares tenham sido ‘brandos’. Quando a tortura se transforma em política de Estado, como de fato ocorreu após o AI-5, o que se tem é a ‘ditadura escancarada’, para falar como Elio Gaspari”, reagiu o editor de política da Folha na sua coluna desta terça-feira, dia 24.

É certo que Fernando de Barros dá uma no cravo e outra na ferradura, enfatizando sua concepção liberal. Democracia política sim; democracia social, nem tanto. Como ele registra, o seu protesto se dá “em nome do que aprendi durante 20 anos de Folha”. Demarcando com os que aderiram ao manifesto de repúdio, ele ataca gratuitamente Cuba, Venezuela e “os figurões e as figurinhas da esquerda nativa” com a sua “retórica igualitária” – por ironia, o mesmo argumento utilizado pela ditadura para não ser nada branca no Brasil. Apesar deste escorregão liberal, entretanto, ele pelo menos resolveu se indignar com o odioso editorial da Folha. Melhor do que o silêncio cúmplice.

“O diário oficial da Oban” – Na onda de repúdio à postura fascistóide da Folha também ressurge sua história sinistra. O livro de Beatriz Kushnir, “Cães de guarda”, renegado pelos resenhistas quando foi lançado em 2004, agora aparece como uma obra indispensável para se entender as íntimas ligações da mídia com o regime militar. Com 404 páginas, ela é resultado da tese de doutorado da historiadora carioca e foi aprovada com louvor na Unicamp. Com base em documentos oficiais e entrevistas, Kushnir prova o “colaboracionismo” dos veículos privados e de muitos jornalistas, que se tornaram “cães de guarda” da ditadura, encobrindo seus crimes e justificando o seu projeto político-econômico.

A autora dedica longo capítulo à Folha de Tarde, o principal jornal da Famíglia Frias nos anos de chumbo da repressão. Editado na época por Antonio Aggio, que depois foi assessorar o senador Romeu Tuma, ex-chefe da Polícia Federal, o jornal virou “o diário oficial da Oban” – a Operação Bandeirantes, que torturou e assassinou vários patriotas. Ele desqualificou os que lutaram contra a ditadura – Lamarca era rotulado de “louco” –; ignorou a morte do jornalista Wladimir Herzog; não deu destaque à prisão de Frei Betto, que fora da sua equipe de reportagem; e transmitiu a versão oficial sobre mortos e desaparecidos – como o do ex-metalúrgico Joaquim Seixas.

A mudança tática do discurso – Durante uma década e meia, a Folha ficou sob o comando da direita golpista e muitos dos seus jornalistas ocuparam cargos na Secretaria de Segurança Pública de São Paulo. Tanto que passou a ser ironizada como o jornal de “maior tiragem” devido à forte presença de “tiras” (policiais) na redação. Com o fim do regime militar, a Folha da Tarde entrou em declínio e faliu; seu lugar foi ocupado pela Folha de S.Paulo. A famíglia Frias tentou esconder seu passado sujo e reciclar seu discurso. Numa entrevista ao jornal Unidade, do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, Kushnir afirma que esta mudança foi tática – a empresa nunca abandonou suas posições de direita.

“Em 1977, o Boris Casoy assumiu a redação da Folha. São tirados todos os nomes dos Frias do expediente, que só vão ser recolocados no jornal em 1984, na época das Diretas. É toda uma jogada de marketing da Folha. Se você repensar hoje o Projeto Folha, ela está muito longe de qualquer análise que diga: ali tínhamos uma redação neutra. Mas as pessoas continuam lendo o projeto Folha como isso. Como um momento em que a Folha vai sair de tudo isso como se nada desse passado tivesse a ver com a família Frias, e vai entrar limpar para a história nesse momento de redemocratização do país, o que não é verdade”.

Agora, com o editorial da “ditabranda”, a Folha retoma sua verdadeira história e tira a máscara!