quarta-feira, dezembro 31, 2008

FUTEBOL E PAIXÃO - ENTREVISTA - JUCA KFOURI

Para fechar bem 2008, vou lançar uma série de entrevistas com três dos maiores cronistas esportivos da atualidade, que tive oportunidade de trocar e-mails nos últimos meses. O assunto permitiu uma análise do jornalismo esportivo atual e como o 'empobrecimento' deste pode influir na própria relação torcedor/esporte.

As perguntas que guiaram o trabalho – compartilhada por Paulo Vinicius Coelho –, foram: uma crônica desprovida de paixão pode jogar na vala comum atletas importantes da nossa história como Romário, Bebeto, Dunga, etc.? Esses jogadores também poderiam ganhar status quase 'sobre-humanos', como os campeões dos três primeiros mundiais pela Seleção, caso fossem descritos por jornalistas como Nelson, Armando Nogueira e Mário Filho?

A dissertação evidenciou as principais mudanças do gênero nos últimos 50 anos. Foram analisados textos de Tostão, Daniel Piza, Torero, Kfouri e Kelen Cristina, sob a luz de Nelson. Enfim, nossa crônica esportiva empobreceu ou não?

Você acredita em um empobrecimento da crônica esportiva atual, quando comparada aos textos da década de 1950, assinados por Nelson Rodrigues, Mário Filho, Armando Nogueira?

Juca Kfouri – Sem dúvida, porque, então, existia o “cronista” esportivo, coisa que hoje tem apenas mestre Armando Nogueira como representante. Mas me pergunto se nesta época de pouco tempo para leitura, de necessidade de informação, se seria mesmo possível manter o estilo dos citados. Ainda mais que eles se beneficiavam do fato de nem existir o videotape...

Nas crônicas em que o enredo gira em torno de um personagem, como você faz a escolha e quais os critérios utilizados? Esse tipo de enredo, com um personagem principal, é bastante utilizado?

JK – Eu raramente uso esse artifício, principalmente no quente de uma rodada. A menos que seja uma atuação assim como a do Zidane, contra o Brasil, na Copa passada. Ou que haja um drama pessoal como um frango decisivo de São Marcos.

Qual a prioridade em suas crônicas (comentário dos jogos, análise tática). E como o leitor reage: faz críticas, sugestões de pauta? A interatividade com o leitor ajuda na escolha da pauta do dia?

JK – A interatividade ajuda no blog, no jornal não. Eu prefiro tratar de bastidores e de emoções e não gosto muito da análise tática, porque ainda acho que o talento é que decide.

Uma crônica desprovida de paixão é capaz de jogar na vala comum atletas que merecem um lugar na história? Jogadores como Rivaldo, Ronaldo, Romário, Bebeto e Dunga, que deram ao país o quarto e o quinto título mundial, e que jamais foram tratados com a reverência dedicada aos campeões de 1958, 1962 e 1970, tiveram tratamento adequado pelos cronistas atuais?

JK – Os três primeiros, sem dúvida. Há belíssimos textos sobre todos eles. Bebeto e Dunga são, de fato, personagens menores.

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Juca Kfouri, 67, é o cronista esportivo brasileiro mais influente da atualidade. Formado em Ciências Sociais, trabalha com esportes desde a década de 1970, quando foi convidado para ser chefe de reportagem da Placar. Tem um defeito: é corintiano. Escreve na Folha de São Paulo e no Blog do Juca, apresenta programas na rádio CBN e na ESPN Brasil. Respondeu à entrevista, por e-mail, em outubro de 2008.

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O blogue moviolaposmoderna foi destaque no Blog do Noblat nesta terça-feira, 30 de dezembro. O jornalista – blogueiro mais acessado do gênero no país – dedicou um post de indicação para esta página, como recomendação de leitura. Agradeço ao Ricardo Noblat, um dos meus guias no exercício da profissão, e ao companheiro Leo Quintino, que apresentou minha página a ele.

Agradeço também aos mais de 200 visitantes, que renderam o número recorde de 400 pageviews em um só dia. Continuem por aqui. Espero que tenham gostado.

Posts novos no forno.

Abraço!
Renan Damasceno

terça-feira, dezembro 30, 2008

CANAL 100 - Imagens líricas do futebol


"Foi a equipe do CANAL 100 que inventou uma nova distância entre o torcedor e o craque, entre o torcedor e o jogo, grandes mitos do nosso futebol, em dimensão miguelangesca, em plena cólera do gol. Suas coxas plásticas, elásticas enchendo a tela. Tudo o que o futebol brasileiro possa ter de lírico, dramático, patético, delirante..." Nelson Rodrigues.

Sobretudo, o cinema mostrou seu valor à sociedade ao registrar e imortalizar os fatos dos últimos 112 anos, ao retratar as mudanças culturais, políticas e sociais desse período – e, ao recriar e representar a história da humanidade, tornar-se fonte confiável de um tempo antecessor à sua própria criação.

Antes mesmo de assumir o formato no qual o conhecemos hoje, em 1916, com Griffith, o cinema já padecia de uma cruel dúvida: enveredava ao registro fiel da sociedade, tal Lumiére, ou partia para um mundo abstrato, lírico, onírico, que não podíamos alcançar, à exemplo de Mélies?

Felizmente, fez os grandes mestres do cinema que essas duas vertentes, antes incompatíveis, pudessem se juntar mais adiante (como em Borges, em Ficciones, as veredas se bifurcam). Nasceram os cinejornais que, num período pré-televisão, transmitiam os acontecimentos entre uma edição e outra (notícias) utilizando os recursos grandiosos das imagens de cinema.

Daí nasceram mitos. No Brasil, pelas lentes das câmeras do Canal 100, Pelé foi entronado Rei; Garrincha virou anjo das pernas tortas e Zizinho tornou-se herói. Chefiado pelo diretor Carlos Niemeyer, a produtora funcionou até 1985, quando o governo de Figueiredo (influenciado por lobistas ligados ao cinema americano) cortou as verbas e inviabilizou a produção.

Ao estudar o jornalismo esportivo da década de 1950, em meu trabalho de conclusão de curso, descobri que o Canal 100, ao lado das crônicas de Nelson, Armando Nogueira e Mário Filho, são alguns dos poucos registros de uma época que o futebol era fascinante, grandioso, mítico.

Vale conferir o site do canal 100 e seu arquivo de vídeos. Assistir aos dribles de Garrincha, aos lançamentos de Gérson, à genialidade de Tostão. Conferir jogos memoráveis, como a vitória do Cruzeiro, de Evaldo, Natal e Dirceu Lopes, sobre o Santos, de Pelé, por 6 a 2, na final da Taça Brasil, em 1966.
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+ Futebol no blog

domingo, dezembro 28, 2008

Café com TaNGO




Estréia nos cinemas brasileiros Café dos Maestros, primeiro longa do diretor argentino Miguel Kohan. Entre ensaios e performances ao vivo, o filme monta um mosaico da cultura do tango. Grandes artistas como Leopoldo Federico, Lágrima Rios, Aníbal Rios, José Libertella e Luis Stazo ensaiam para uma apresentação ao vivo de gala no Teatro Colón, na capital argentina. Eles possuem diferentes estilos, diferentes origens. Conversam, contam histórias e Miguel Kohan vai montando o que é muito mais do que um documento sobre esse ritmo que é tão importante para os argentinos quanto o samba para os brasileiros.

(Agência Estado, 26/12/2008)

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+Música latina no blog
Buena Vista Social Club
+Sobre o filme na rede
Estadão – Filme faz um tributo ao tango
La Nación –Los ases del tango




terça-feira, dezembro 16, 2008

O Jazz na tela grande


O Estadão.com disponibilizou na seção multimídia dois podcasts intitulados O Jazz na tela grande. O jornalista Emerson Lopes, responsável pela série Jazzy, listou uma gama de músicas e músicos que estreitaram a relação entre esse gênero musical e o cinema. Os áudios estão divididos em duas partes, em mais de duas horas de programa.


Filmes como Bird, de Clint Eastwood, que conta a trajetória do saxofonista Charlie Parker – ao lado de Dizzy Gillespie, o pais do bebop, em fins dos anos 1940 –, e as trilhas sonoras de Hary e Sally e A era do rádio estão no cardápio.

Forest Whitaker, que foi genial ao reviver o inferno astral sob efeito de heroína de Parker, em Bird, vai novamente interpretar um dos grandes nomes do jazz: Louis Armstrong, em What a Wonderful World, sem previsão de estréia. A cinebiografia autorizada do trompetista será produzida pelo estúdio francês Legende – o mesmo de La vie en Rose, sobre Edith Piaf.

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sexta-feira, dezembro 12, 2008

Supermercado de produtos culturais


Dizem por aí que já não se faz jornalismo cultural como antigamente, com textos extensos, críticas mordazes e perfis minuciosos e densos. Aliás, falam por todos os cantos que tudo que é bom está morrendo: o futebol arte, o cinema como arte, a arte.

Encontram fundamentos para julgar os cadernos de cultura atuais, os críticos que destacam que essas páginas tem se transformado em um aglomerado de textos de serviços. Talvez isso seja reflexo da própria cultura: se vende um espetáculo, um filme. Lógica do consumo. Lobão – que está longe de ser um grande ídolo meu –, já esbravejou uma frase sintomática: 'A arte se torna arte ao ser consumida'.

A Folha está comemorando os 50 anos do caderno Ilustrada. Uma série de debates sobre o passado e o futuro da cultura e do jornalismo ocorre no MASP, em São Paulo, que pode ser acompanhado na íntegra no Folha Online.

Aos fãs das rodas de boa conversa, abaixo está o vídeo integral da discussão sobre "Cultura e Jornalismo" – o último de três debates. Estão presentes, Ruy Castro e Martinas Suzuki. Vale a pena.





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+ jornalismo cultural no blog:
A arte dos obituários
+ jornalismo cultural na rede:
Ilustrada – Especial 50 anos
Gonzo – O filho bastardo do newjournalism
+ download:
Baixe o livro Jornalismo Cultural (Fábio Gomes)

terça-feira, dezembro 09, 2008

Cine-mundi: Bolívia – A proposta libertária de Ukamau


Ukamau (dir. Jorge Sanjinés, 1966) é uma das mais instigantes e belas obras do rico cinema latino-americano da década de 1960. Com enredo envolvente, denuncia os atritos entre o povo andino e os mestiços – uma alegoria das reivindicações indígenas, tão maltratados pelos colonizadores.

A história gira em torno do assassinato da mulher de um camponês, a mando de um mestiço. Durante um ano, o aymara Andrés Mayta, arquiteta sua vingança. No dia escolhido, numa tomada aérea – que muito lembra a luta de Antônio das Mortes, em o Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro, de Glauber –, os dois partem para a luta corpo a corpo.

Aí, o choque de genialidade de Sanjínes: em vez de dar ao camponês a chance de matar sem piedades o mestiço, propõe um luta, na qual o indígena dita as regras. Há uma inversão de valores sociais. Não há um triunfo pelo simples sabor da vingança e, sim, uma proposta libertária, que dá ao oprimido a chance de exercer o poder sobre o ex-opressor.

Em Ukamau, assim como em outros filmes da época, há uma ligação muito forte com a terra. Seja no arado, no cultivo, ou mesmo na proposta nacionalista de defesa do território. Aliás, o viés documental, é proposta chave do cinema da época: menos vale o roteiro dos filmes – apesar que Sanjinés foi brilhante no seu –, do que o retrato social da América Latina feito pelas lentes desses diretores.

Esse recorte da sociedade foi proposto por quase todos diretores e produtores dos anos 1960. A Argentina tem seu documento histórico na Escola de Santa Fé, de Fernando Birri; Cuba, nas lentes de Gutierrez Alea; e assim por diante. Talvez o Brasil seja o país mais difícil de identificar apenas um diretor que retrate o país, uma vez que Glauber Rocha se propôs em criar um cinema universal.

A universalidade também parece eficaz na luta pela solidificação do cinema latino-americano. Dessa forma, Glauber se propõe a desmitificar oprimido e opressor, dominante e dominado. Ao criar um sujeito universal, ele repensa a organização da sociedade e modifica nossa concepção histórica de que o povo latino-americano sempre será oprimido.

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segunda-feira, dezembro 08, 2008

O Lado B das coisas


Depois de quase um mês mergulhado nos textos de futebol de Nelson Rodrigues, sem tempo para qualquer outra atividade – inclusive para um melhor acabamento deste humilde blogue –, retomo o andamento desta página sem muitas promessas de fim de ano. De novidade somente o nome, que mudou para Moviola Pós-Moderna, as colaborações e as atualizações, que serão mais constantes, já que não tenho mais as atribuições de universitário (enfim, 98,5% jornalista).

O nome foi escolhido uma vez que o anterior (espacopinião) não fazia mais sentido – se algum dia fez. Moviola é uma marca de equipamentos cinematográficos que se tornou sinônimo de mesa de montagem. Nela, o rolo do filme passa por um visor, que permite ao montador assistir, cortar e colar os frames. Coisa de russo, que, aliás, entendiam tudo de montagem – Einsenstein e Vertov não me deixam mentir.

Já o ‘pós-moderno’, como tudo que é pós-moderno, serviu como adjetivo para algo que não tem definição correta. Como esse blogue sempre foi um baú asiático, sem muitas pretensões ou objetivos, casa-se perfeitamente.

Por fim, nada aqui será tão moderno ou pós-moderno (para o azar de quem procura coerência). Retorno à missão de escrever sobre filmes pouco vistos, temas nada discutíveis e assuntos pouco interessantes.

Agradeço às 9.000 visitas nos dois anos da primeira era dessa página. Continuem por aqui. Abraços.
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Foto: arquivo Alessandro Bastos. Excelente fotógrafo de portifólio invejável. Clique aqui para ver o site, e aqui para acessar seu multiply.

Leon Hirszman - Deixa que eu falo...


Responsável pela organização e relançamento da obra de Leon Hirszman, o montador Eduardo Escorel não poderia ter escolhido forma melhor de homenagear o diretor, morto em 1987: Deixa que eu falo – exibido no Forumdoc.bh, ainda não lançado em circuito comercial –, destaca-se pela riqueza de imagens de arquivo, que ditam por si só o andamento do documentário.

O título foi escolhido para que Escorel não se colocasse na posição de narrador onipresente sobre a vida e obra de um amigo tão íntimo. O subterfúrgio narrativo foi atribuir ao próprio Leon as coordenadas, em uma espécie de documentário póstumo. Para isso, Escorel resgatou entrevistas e arquivos pessoais do diretor e “deixou que ele falasse”.

Segundo o diretor, o documentário não teve roteiro e foi construído a partir da pesquisa de material. Tratando-se de um exímio montador, Escorel organiza 70 minutos de filme com fragmentos que fogem da própria realidade e filmografia de Hirszman: para falar da chegada da família de Leon ao Brasil, utiliza trechos de O Imigrante (Chaplin, 1917), para citar a relação do diretor com os grevistas do ABC Paulista, evoca imagens de A Greve (Eisenstein, 1924).

Deixa que eu falo se destaca por falar muito em pouco tempo. É uma viagem ao mais íntimo de Leon Hirszman – um dos mais importantes nomes da cultura brasileira e um dos fundadores do Cinema Novo –, sem cair no lugar comum de tantos documentários biográficos.
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+ Cinema Novo neste blog:
- Breve biografia diGlauber
- Clássicos do cinema brasileiro: Vidas Secas
+ Vídeos
- Assista ao curta Partido Alto, dirigido por Hirszman, em 1982
- Assista ao trailer de Eles Não Usam Black Tie, de 1981
+ Leon na rede
- Site oficial do diretor

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domingo, dezembro 07, 2008

Agrippino nas Panaméricas de Áfricas utópicas


José Agrippino de Paula deixa qualquer cinema alternativo dito ‘underground’ no chinelo. Comparado às suas produções, Sganzerla e o cinema marginal tornam-se Hollywood. Assisti um de seus filmes há poucas semanas: Hitler terceiro mundo, de 1968, uma obra futurista e visionária, fragmentada em blocos desconexos, com direito a Jô Soares, em papel de samurai, e participação de Zé Ramalho.

Aliás, tudo parece de vanguarda em Agrippino: seja no teatro, no cinema ou em seu mais conhecido livro: “PanAmérica”, de 1967, relançado pela Editora Papagaio. Essa obra de contracultura tem como protagonistas Marilyn Monroe, Che Guevara, Cecil B. de Mille, Marlon Brando John Wayne, entre outros ícones da cultura de massa. Eles participam de uma filmagem de episódios da Bíblia, interagindo com o narrador em primeira pessoa em uma atmosfera alucinógena.

Morreu ano passado, aos 69 anos, de infarto, em Embu, onde morava envolto de livros antigos, traças e teias de aranha, recluso e sem qualquer ligação com a tecnologia.

Fiz esse post para linkar um excelente curta sobre o autor. Abaixo em duas partes.

Passeio nos recantos silvestres – Parte 1



Passeio nos recantos silvestres – Parte 2



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+ Autores do cinema brasileiro neste blog
O cinema gritante de Ana Carolina
+ Agrippino na rede
Veja: Leia o perfil de Agrippino
Revista Trópico: Ficção contracultural brasileira
Folha de S. Paulo: Takes impressionistas



segunda-feira, outubro 06, 2008

Dos 500 melhores filmes da Empire, apenas um brasileiro. E em 177º

Seja para escolher filmes, músicas ou times de futebol de botão, toda lista gera discussão. E, certamente, as seleções de melhores e mais influentes películas de todos os tempos lidera o ranking das listagens mais contestadas. Afinal, qual o parâmetro correto para atribuir a Cidadão Kane um título que também pode pertencer a trilogia do Poderoso Chefão, de Francis Ford Coppola, ou, até mesmo, em nossa era digital, ao Senhor dos Anéis?


Em 2007, a Revista Bravo lançou uma edição especial dos 100 filmes mais influentes da história, deixando de lado clássicos como Dr. Jivago (Épico baseado no romance de Boris Pasternak) e adicionando escolhas controversas como Los Angeles – Cidade Proibida e o brasileiro Lavoura Arcaica (sim, ótimo filme, de um conteúdo lírico e fotografia maravilhosa, mas pergunte sobre essa adaptação de Raduan Nassar em qualquer outro lugar do planeta...).

Essa semana, a revista britânica Empire lançou a lista dos 500 melhores filmes, eleitos por 10 mil leitores, 50 críticos e 150 cineastas, incluindo Quentin Tarantino, Pedro Almodóvar e Sam Mendes. A liderança – ao contrário da publicação brasileira, que escalou o clássico de Orson Welles na primeira colocação – ficou com o primeiro filme da trilogia de O Poderoso Chefão, de 1972.

A seleção britânica impressiona por algumas peculiaridades: filmes recentes, como Pulp Fiction (dir. Quentin Tarantino, 1994) e Clube da Luta (dir. David Fincher, 1999) ocupam a nona e a décima colocação, respectivamente. Cidadão Kane apareceu na tímida 28ª colocação e o primeiro de língua não-inglesa a dar as caras foi Andrei Rublev (1969), do russo Andrei Tarkovsky, na 36ª colocação. Além da película russa, entre os 50 primeiros, apenas Os incompreendidos, de François Truffaut e Os Sete Samurais, de Akira Kurosawa, em 41º e 50º posição, repectivamente.

Para quem esperava Central do Brasil, de Walter Salles, ou O Pagador de Promessas, de Anselmo Duarte, a lista da Empire decepcionou. O único tupiniquim a ser citado foi Cidade de Deus, de Fernando Meirelles, na tímida 177ª colocação. Glauber Rocha sequer foi relacionado, embora outros experimentais como a fase mexicana de Buñuel, Jean-Luc Godard e a nova onda, entre outros, tenham aparecido – e bem colocados.

A lista completa você pode ver no site da Empire ou, se preferir, nesse link (lista completa, sem fotos)

quinta-feira, outubro 02, 2008

Entenda a crise americana

Você deve estar cansado de ouvir nos jornais sobre a crise na economia americana, mas como não tem saco pra prestar atenção e entender todo aquele papo jornalístico, aqui vai uma versão para leigos do que aconteceu na economia dos EUA:

É assim:

O seu José tem um bar, na Vila Carrapato, e decide que vai vender cachaça 'na caderneta' aos seus leais fregueses, todos bêbados e quase todos desempregados.

Porque decidiu vender a crédito, ele pode aumentar um pouquinho o preço da dose da branquinha (a diferença é o sobrepreço que os pinguços pagam pelo crédito) e ter um lucro maior.

O gerente do banco do seu José, um ousado administrador formado em curso de Administração e com MBA, decide que as cadernetas das dívidas do bar constituem, afinal, um ativo recebível, e começa a adiantar dinheiro ao boteco tendo a pindura dos pinguços como garantia.

Mais adiante, alguns executivos do banco lastreiam os tais recebíveis e os transformam em CDB, CDO, CCD, UTI, OVNI, SOS ou qualquer outra sigla financeira que ninguém sabe exatamente o que quer dizer.

Esses adicionais instrumentos financeiros, alavancam o mercado de capitais e conduzem a operações estruturadas de derivativos, na BM&F (Bolsa de Mercadoria e de Futuros), cujo lastro inicial todo mundo desconhece (as tais cadernetas do seu José ).

Mais adiante, esses derivativos estão sendo negociados como se fossem títulos sérios, com fortes garantias reais, nos mercados de 73 países.

Até que alguém descobre que os bêbados desempregados da Vila Carrapato não têm dinheiro para pagar as contas, e o Bar do seu José vai à falência.

E toda a cadeia desmorona.
Fim.

(Texto: http://abandapodre.blogspot.com )

quarta-feira, outubro 01, 2008

O fatídico dia em que eles resolveram trocar de palco

Esses dias, numa brincadeira de fim de treino, o técnico Adílson Batista brincou comigo, dizendo que “para agüentar vocês (jornalistas), só ao som de Maria Rita”, referindo-se ao álbum da filha da Elis, que estava no playlist. E, como a relação do futebol com as artes sempre me desperta interesse, resolvi abrir o baú de quinquilharias cibernéticas (Google) e investigar a ligação desses dois mundos tão distantes: o futebol e a música.

Descobri que alguns gênios da bola resolveram trocar de palco por alguns instantes. E confesso que minhas descobertas foram tão ruins quanto assistir Guarani e Villa Nova, pelo Campeonato Mineiro. Além da conhecida e não tão majestosa incursão do Rei Pelé pelo mundo da música, achei por intermédio do blog Ipisis Litteris um álbum gravado pelo genial Johan Cruijff.

Se nosso rei gravou faixas um tanto quanto melosas, como “O coraçao do rei”, “Amor e agressão”, sob a tutela do pianista e arranjador Sérgio Mendes, o holandês não fez por menos: lançou músicas com o nome de “Oei oei oei (dat was me weer een loei)” e “Alle stoppen ineens naar de knoppen”, que não faço a mínima idéia do que se tratam. De flamengo (idioma dos países baixos), só entendo do nosso, aliás, meu time do coração.

E não pára por ai: lembram do goleiro Ronaldo? Ele foi bandleader do Ronaldo e os Impedidos, grupo de rock’n roll, em alto e bom som, formado na capital paulista.

Você ainda acha que não dá pra piorar? Marcelinho Carioca criou o grupo Divina Inspiração, uma espécie de pagode gospel, com o auxilio do volante Amaral, que provou não ser apenas um rostinho bonito e mostrou talento aos pandeiros.
Outro companheiro de Timão, o atacante Mirandinha, foi o idealizador do grupo Só pro meu prazer. No mesmo ramo, porém fora dos palcos,
Denílson tornou-se o comandante do Soweto, na década de 1990.

Enfim, percebe-se que alguns atletas perderam preciosos minutos de peladas com os amigos para se dedicarem à musica. Para quem acha que o futebol carece de arte nos últimos tempos, basta ouvir os discos para ter certeza que esses artistas não devem sair de onde estão.


domingo, setembro 21, 2008

Se Deus tivesse uma voz...


Tive a oportunidade de assistir pela segunda vez esse ano a apresentação de Milton Nascimento. Se na primeira foi primoroso vê-lo acompanhado do Jobim Trio, no show Novas Bossas, em Belo Horizonte, dessa vez teve sabor mais que especial, pelo local, peculiaridades do repertório e pela oportunidade única do evento: na praça Tiradentes, em Ouro Preto, Bituca foi acompanhado por Wayne Shorter, aos sopros),e Ron Carter, ao baixo, no encerramento do Sétimo Festival Tudo é Jazz, no qual foi o grande homenageado.

Se o atraso de quase uma hora obrigou Milton a uma entrada bem menos apoteótica, a pitada de espetáculo veio com a seqüencia de músicas populares no começo da apresentação – agradando boa parte que estava pouco ligando para quem era Carter ou Shorter. Mas, todos admitem, que o repertório agradou até quem foi para ver esses dois monstros sagrados do jazz.

Juntos – sem muito entrosamento, pois Carter assitiu boa parte da apresentação, sentado apenas batucando na face do baixo –, relembraram músicas do Native Dancer (álbum de Wayne, com participação de Milton), Angelus (de Milton, com a presença deles) e outras da veia jazzística pouco conhecida de Bituca.


Por mais que eu tenha achado uma apresentação morna (talvez idealizava assitir uma explosão de sons e musicalidade, regada pela fusão experimental dessas culturas musicais tão distintas), não nego que sempre vou ter de contar que aestive lá, acompanhado de boas pessoas, álcool e cigarro de palha. E que o último dia do Festival era propício para um desfecho dessa grandiosidade. Experimentei, a poucos metros, o improviso de Wayne em Ponta de Areia e Milagre dos Peixes, e o gravíssimo baixo de Ron criando uma atmosfera musical extremamente diferente de quase tudo que já ouvi – e olha que já experimentei de Slayer a João Donato!

+MULTImídia

+ Assista ao show de Ouro Preto, em 16 partes, no Youtube
+ Vídeo: Wayne e Milton – Lilia
+ Vídeo: Wayne e Milton – Tarde (1991)
+ Torrent: Download do CD Angelus, de 1993


quinta-feira, setembro 18, 2008

E eis que Deus adentra às quatro linhas

Excelente matéria assinada por Cathrin Gilbert, da revista alemã Der Spiegel, tradução de George El Khouri Andolfato. A matéria na íntegra você pode acompanhar no Mídia Global (para assinates UOL) e neste link (para não assinantes).



Muitos brasileiros que jogam por clubes de futebol europeus são membros de congregações pentecostais e estão determinados a divulgar sua fé. Apesar dos jogadores terem que doar um décimo de sua renda considerável para suas igrejas, eles freqüentemente não sabem onde vai parar o dinheiro.

Marcelo Bordon, um zagueiro de futebol, é um verdadeiro urso. Ele está sentado no restaurante de propriedade do Schalke 04, o time da Bundesliga (o campeonato alemão de futebol) no qual joga. Com seu cabelo alisado para trás, corpo musculoso e tatuagens, ele poderia facilmente se passar por um guarda de prisão em Nova Jersey. Mas ele fala suavemente, explicando o amor que o ajuda quando está em dificuldades, e sobre aquele que sempre esteve lá para ajudá-lo, desde que entrou na sua vida. Bordon fala do Espírito Santo.

O brasileiro de Ribeirão Preto, que veio para a Alemanha em 1999, é um evangélico. Ele é membro de uma igreja pentecostal carismática, que prega um respeito rígido à Bíblia e um "relacionamento pessoal com Deus". Esta é, segundo ele, a única igreja verdadeira de Jesus Cristo. Bordon, 32 anos, exibe uma tatuagem entre seus ombros, com as palavras "Jesus é minha Força" gravadas em sua pele em letra ornada.

A Bíblia nos diz para sermos soldados de Deus, ele diz, tomando um suco de maçã.

Cerca de 35 milhões de brasileiros - quase um entre cinco - são evangélicos. O número deles cresce em dois milhões ao ano, e 70% deles são, como Bordon, membros de congregações pentecostais carismáticas.

Há 40 anos, o Brasil ainda era um país 90% católico. Mas agora que os evangélicos mudaram seu foco da conversão dos pobres para a pregação de que a riqueza e o consumo são sinais de verdadeira fé, eles estão começando a ter apelo junto a artistas, políticos e atletas bem remunerados. Os jogadores de futebol, uma das exportações mais bem-sucedidas do Brasil, estão levando sua fé para o mundo.

No passado, eram jogadores como Jorginho e Paulo Sérgio do Bayer Leverkusen que convidavam publicamente outros jogadores para participarem dos grupos de discussão da Bíblia. Depois disso, jogadores como Zé Roberto e Lúcio do Bayern de Munique, ou Cacau do Stuttgart, exibiam suas camisetas brancas com frases como "Jesus Te Ama" após cada gol em uma partida da Bundesliga. Eles tiravam mecanicamente a camisa do seu time que vestiam sobre suas camisetas de Jesus.

Agora que a Fifa, a federação internacional de futebol, proibiu toda declaração política e religiosa no material esportivo dos jogadores, os evangélicos passaram a celebrar de forma mais discreta. O meio-campista Gilberto, que jogou pelo Hertha BSC de Berlim até janeiro, agora reza em Londres, no Tottenham Hotspur, o jogador Edmílson ora em Villarreal, Espanha, Cris, em Lyon, Luisão, em Lisboa, e o astro Kaká, em Milão. (...)

segunda-feira, setembro 08, 2008

Festival Tudo é Jazz - Programação

Depois de receber Herbie Hancock, em maio, o Brasil terá a apresentação de mais dois monstros sagrados do jazz americano. No encerramento do Sétimo Festival Tudo é Jazz, Wayne Shorter e Ron Carter são convidados por Milton Nascimento à reviverem a parceria clássica de 1993, no disco Angelus, no qual Bituca contou com um dream team formado por Carter, Shorter, Hancock, Peter Gabriel, entre outros.

Já data de décadas a ligação de Milton com o Jazz. O próprio Hancock, em lua de mel no Brasil, em meados da década de 1960, ficou espantado com a voz do mineiro, quando este pegou o violão para arranhar alguns acordes. De pronto, pediu para que Bituca parasse até que um gravador fosse encontrado. Outra importante ligação entre os músicos é a participação do brasileiro em Native Dance, álbum de jazz fusion de Shorter.

Para o Festival, que acontece em Ouro Preto, Hancock foi cogitado, mas o cachê inviabilizou sua presença. Mês que vem será a vez de Sonny Rollins descer em terras brasileiras para assombrar os palcos do Tim Festival em duas noites (dias 21 e 25 de Outubro)

quarta-feira, setembro 03, 2008

O jeito mineiro de pensar e fazer cinema

*Reportagem inscrita no Prêmio BDMG de Jornalismo Cultural 2007

Renan Damasceno

Quase um século se passou desde que “aquele mocinho engrouvinhado, que tem cara de infusório” adentrou a sala do diretor do Diário de Minas, carregando embaixo do braço a crítica do filme Diana, a caçadora. O longa-metragem, provavelmente americano, acabara de estrear no recém-inaugurado Cine Pathé, na Avenida Afonso Pena, e se transformou em assunto obrigatório entre os belo-horizontinos, qualificado como “mais do que prejudicial, nojento” pela conservadora Liga pela Moralidade. O mocinho – descrito acima com muita acidez pelo escritor Eduardo Frieiro – era Carlos Drummond de Andrade, que acabara de mudar de Itabira para tornar-se jornalista na capital mineira. Drummond também despejava críticas moralistas sobre o filme em seu primeiro artigo na grande imprensa, “Diana, a moral e o cinema”, publicado em 15 de abril de 1920, por um outro jornal, o Jornal de Minas.


Belo Horizonte era uma cidade que oscilava entre a modernidade e a tradição. A primeira exibição de cinema em Minas Gerais – 22 de julho de 1897, em Juiz de Fora –, havia acontecido apenas 18 meses após a sessão inaugural feita pelos irmãos Lumiére, no subsolo do Grand Café, em Paris, e chegaria à recém-formada capital mineira em 1898. Logo nos primeiros anos do século XX, a sétima arte encontraria adeptos fiéis, incrementada pela revolução narrativa de D.W. Griffith, em 1915 (diretor de O nascimento de uma nação, primeiro longa-metragem da história) e também pelo surgimento de vários cinemas, como o Cine Pathé e o Cine Odeón, à Rua da Bahia.

Já o jornalismo capengava entre sucessivas aberturas e fechamentos de jornais, escorado por uma Associação Mineira de Imprensa não menos desestruturada, que sobreviveu por quatro anos – de 1918 a 1922.

Dos jornais da época, que conseguiram mais de meia dúzia de edições, destaca-se o Diário de Minas, fundado em 1899 e órgão oficial do Partido Republicano Mineiro. Muita coisa mudou desde as exibições do Cine Pathé, e os jovens cinéfilos puritanos e moralistas das primeiras décadas, certamente, ateariam fogo nas salas de cinema se assistissem, quase 50 anos depois, à obra de seu conterrâneo, Neville d’Almeida, que trouxe para as telas A Dama da Lotação e Os Sete Gatinhos, adaptações das célebres crônicas de Nélson Rodrigues.

Confira a Galeria de Fotos dos cinemas de BH





















1 - Cine Odeón, à Rua da Bahia (década de 1910)
2 - Cine Floresta, esquina de Pouso Alegre e Itajubá (déc. de 1910)
3 - Cine Glória (déc. de 1920)
4 - Cine Metrópole (déc de 1940)

5 - Cine Brasil, arquitetura art decó no coração da cidade (déc de 1930)
6 - Cine Brasil (déc. de 1930)


A nova geração de Cataguases

Cataguases, um lugarzinho atrasado que vivia sonolento às margens do Ribeirão Meia Pataca, presenciou na década de 20 o nascimento de dois movimentos importantes na cultura brasileira: A revista modernista Verde e o cinema de Humberto Mauro. Até então, o solitário motivo de orgulho para a cidade era a glória de ter inventado o picolé. “Sem palito, mas picolé”, ressalta o cineasta.

Mesmo a cidade obtendo importância histórica graças a Humberto Mauro, o movimento modernista de Cataguases não passou despercebido. Em 1927, nascia a primeira edição da revista Verde, influenciada pelos textos que balançavam as estruturas da literatura brasileira pós-Semana de 22. Em suas seis edições, a revista contou com a colaboração de nomes importantes como Jorge de Lima e Murilo Mendes. Tudo isso graças a Rosário Fusco, que aos 17 anos, sem nenhuma cerimômia, pediu ao autor de Macunaíma que lhe enviasse “uma bosta qualquer”, para uma revista que estava organizando com alguns amigos. Mário, surpreendido com o bilhete, não relutou em colaborar.

Na primeira edição da revista, Rosário dedica um artigo ao lançamento de Tesouro Perdido, segundo longa-metragem do conterrâneo. Na edição 5, J. Martins aplaude a iniciativa de Mauro, e prevê uma “hollywood-mirim” em Cataguases. Mas a relação entre os dois grupos termina por aí. A Verde encerra seu expediente em 1929, ano em que o outro filho ilustre da cidade muda-se para o Rio de Janeiro. Humberto Mauro, apaixonado por fotografia, enxergou a possibilidade de fazer cinema ao conhecer o fotógrafo italiano Pedro Comello.

O cinema brasileiro estava em crise com o domínio massivo dos americanos e a única saída eram os ciclos regionais. “O ciclo de Cataguases obteve sucesso graças ao financiamento de fazendeiros e comerciantes da Zona da Mata, que investiram nessa aventura”, conta o historiador Rafael Ciccarini, professor de Cinema Brasileiro da Escola livre de cinema de Belo Horizonte. Segundo o historiador, outra coisa que favoreceu a realização, quase artesanal, de filmes como Na Primavera da Vida (1926) e Tesouro Perdido (1927) era o conhecimento técnico de Mauro, formado em eletromecânica.

Após dirigir quatro filmes em Cataguases, Humberto Mauro – já reconhecido como grande diretor pela revista Cinearte, de Adhemar Gonzaga – vai para a Cinédia e dirige seus principais longas, entre eles Ganga Bruta (1931-33), A voz do Carnaval (1933) e Favella dos meus amores (1935). Anos depois, a convite do ministro Gustavo Capanema, Mauro se vincula ao Instituto Nacional de Cinema Educativo, produzindo 357 filmes científicos e educativos, até 1972.

Mesmo com o reconhecimento de público e crítica nos anos de Cinédia, Humberto Mauro só alcançou o título de “fundador do cinema brasileiro” na virada dos anos 1950 para os 60, por críticos como Alex Viany e Paulo Emílio Salles Gomes (esse último reconstruiu a experiência do cineasta no livro Humberto Mauro: Cataguases, Cinearte). Rafael Ciccarini também ressalta a importância do diretor na formação do Cinema Novo: “Da metralhadora de críticas que Glauber Rocha disparou, com sua revisão sobre nosso cinema, sobrou pouca coisa. Entre elas, o nome mais aclamado foi de Humberto Mauro”.

A cidade com o maior número de críticos por Km²

A história do cinema brasileiro começou a ser reescrita em meados dos anos 50 com o engajamento de críticos responsáveis por reformular a relação entre o Brasil e as novas tendências do cinema mundial. Influenciados pela nova crítica francesa da Nouvelle Vague e fortalecidos pelo cineclubismo, os cineastas brasileiros enxergaram a possibilidade de criar um novo cinema, ou seja, um Cinema Novo, movimento teorizado e liderado por Glauber Rocha. Belo Horizonte, no final dos anos 40, abrigou um dos mais importantes e consistentes cineclube do país.


A dedicação dos mineiros à crítica de cinema culminou na publicação da Revista de Cinema – criada por Cyro Siqueira, no início da década de 50, que se estendeu ao longo de dez anos, com 24 edições – e no CEC, Centro de Estudos Cinematográficos, criado em 1951. Tal paixão foi lembrada pelo jornalista Humberto Werneck, em seu livro O Desatino da Rapaziada, dizendo que a capital mineira “se converteu na cidade com o maior número de críticos de cinema por quilômetro quadrado”. Fábio Leite, crítico de cinema do jornal Hoje em Dia e filiado ao CEC desde a década de 70, atribui esse fenômeno à presença marcante da sétima arte na vida da população que, segundo ele, “naquela época, não tinha muita coisa pra se fazer”. “Assistíamos aos filmes e depois ficávamos horas discutindo nas mesas dos bares. Até na Faculdade de Engenharia Química da UFMG improvisava-se um pano branco para exibições após a aula. Profissionais, de todas as áreas, começavam a esboçar um espírito crítico em relação aos filmes, e a base encontrávamos no CEC, com mostras, palestras e debates”, explica.

O CEC foi fundamental na formação de várias gerações de críticos. Muitos, como Marcelo Castilho Avelar e o próprio Fábio Leite, atuam na imprensa mineira. O centro de estudos ainda funciona em uma pequena sala no Palácio das Artes e é um dos realizadores do festival Curta Minas, mas não tem a mesma força de antes. Já a Revista de Cinema alcançou repercussão internacional e foi responsável por introduzir na pauta dos críticos brasileiros, cineastas como Luís Buñuel e Ingmar Bergman. Com a solidificação da imprensa em Minas, o jornalismo e a crítica escreveu uma história de estreita relação com o cinema, sendo responsáveis por alimentar a paixão dos mineiros pela sétima arte.