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quinta-feira, outubro 01, 2009

Santiago, o memorioso


Assisti, com mais de dois anos de atraso, ao documentário Santiago, de João Moreira Salles, que esteve na programação do Canal Brasil semana passada, no É Tudo Verdade. O filme sobre o excêntrico mordomo da família Moreira Salles me fez lembrar, do começo ao fim, do conto Funes, o memorioso, que compõe o livro Ficciones, do argentino Jorge Luís Borges.

O reli depois de anos. Funes, por um acidente, é dotado de uma memória prodigiosa, capaz de decorar tomos de Plínio, mapas do tamanho físico de uma cidade e recordar das 24 horas de um dia. Por isso, fica relegado ao quarto dos fundos de uma velha fazenda, no escuro.

Santiago, decendente de italianos radicado no Brasil, também é dotado de memória invejável. Datilografou resmas de papel com notas sobre atores do cinema e teatro, cantores, músicas e gente da sociedade carioca. Tentou deixar de herança ao mundo um pouco de tudo aquilo que guardou mais de meio século na lembrança. Assim como Funes, Santiago vivia só, em um pequeno quarto dos fundos da mansão dos Moreira Salles, em...... Bem, não tenho a memória deles...

Digno de nota também a auto-crítica de João Moreira ao final do documentário: "Por mais que tentasse tirar expressões naturais de Santiago, ficava claro que ele era o Mordomo e eu, o filho dos donos da casa". E se memória é o eixo do documentário, João pode, ao retomar o material filmado em 1992, reconstruir um pouco de sua história e de seus irmãos.

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+ Sobre documentários neste blog:

Documentário Brasileiro do Século XXI
Edifício Master – a solidão no meio da metrópole
Waldick – Durango Kid à brasileira
Leon Hirzsman – Deixa que eu falo
Estamira – O olhar que tudo pode ver e tudo pode revelar
Glauber Rocha - Maranhão 66/Senado 09
Heavy Metal - Ruído das Minas

+ Sobre Borges neste blog

Borges vai ao cinema
Borges - James Joyce


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quinta-feira, setembro 10, 2009

O cara na fila da padaria pode ter vendido milhares de disco. E você nem sabia.


"A barulheira nunca foi uma opção estética: era falta de capacidade de
tocar outra coisa".


Para os ortodoxos fãs de heavy metal extremo a frase pode parecer uma blasfêmia, mas para o produtor Gauguin, que gravou as primeiras bandas de death metal em Minas Gerais - e para os demais seres humanos com ouvidos - é uma constatação.

O depoimento foi dado ao documentário "Ruído das Minas", que teve pré-estréia na mostra Músicas do Underground, que compõe a programação do Festival Indie.2009, que terminou nesta quinta-feira (10.09), fazendo bem menos barulho do que as edições anteriores. O filme, que nasceu de um projeto experimental de alunos da UFMG, investigou o nascimento e proliferação das bandas de metal pesado em Belo Horizonte na metade da década de 1980.

Para quem nunca teve contato com o estilo, vale saber que o Heavy Metal é uma espécie de universo a parte, com suas gravadoras, mercado, público e deuses próprios. Por isso para muitos é difícil compreender que, na mesma praça de Santa Tereza, nasceram Clube da Esquina e Sepultura, e que, em algumas praças na Europa, um disco do Sarcófago é mais cultuado que Milton Nascimento.

Ruído das Minas, mesmo com suas dificuldades - som e edição tão artesanal quanto as gravações das primeiras demo-tapes, sem que isso o desmereça -, explora uma geração pouco lembrada da história da capital mineira, cultuada mundo afora, mas desconhecida no quintal da própria casa.

A explosão dessas meia-dúzia de importantes bandas colocaram o Brasil no mapa do underground: Sarcófago, Sextrash, Mutilator, Witchhammer, Kamikase, Chakal, Holocausto, Overdose, The Mist e o próprio Sepultura, gravados pelo selo mineiro Cogumelo, há duas décadas, conquistaram o mercado brasileiro e passaram a ser reverenciados nos Estados Unidos e Europa.

Os despretensiosos bolachões recheados de ódio, sangue e gravuras macabras correm o mundo até hoje, disputados à tapa pelos colecionadores.

Sepultura x Todos

E você deve se perguntar porque ouviu falar só do Sepultura até hoje. Bem, pergunte para Gloria Cavalera, empresária da banda e esposa do ex-vocalista Max. O rancor de alguns depoimentos provam que o Sepultura e sua empresária abriram e fecharam a porta logo em seguida, impedindo o avanço das outras bandas.


No entanto, a tática não funcionou por completo. Se preteriu comercialmente, ao menos contribuiu para a aura mitológica que algumas bandas assumiram da década de 1990 em diante. Para alguns fãs de metal isso vale muito mais. O que importa não é diferenciar a barulheira grotesca das tapes de garagem do Mutilator ou do Sextrash. Honroso é exibir um LP original da coletânea Warfaire Noise, de 1987, ou guardar num baú sob sete chaves um flyer desenhado a mão do show de lançamento do split-álbum Século XX/Bestial Devastation.

Ah, só pra constar, uma das minhas alegrias de juventude foi conseguir uma cópia de Screeches from the Silence, único vídeo produzido pelo Sarcófago. Era um ritual assisti-lo e ver a cara de espantado do resto da turma.

Abaixo o trailer de Ruído das Minas e a entrevista do diretor Felipe Sartoreto à MTV:




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terça-feira, maio 05, 2009

Documentário brasileiro do Século XXI


O Cine Humberto Mauro, do Palácio das Artes (BH), apresenta, entre 4 e 12 de maio, a mostra Documentários de Busca. Foram escolhidos quatro documentários que marcaram o amadurecimento no Brasil, no início do século XXI, de uma forte tendência do documentarismo mundial, onde o universo pessoal do realizador assume papel de destaque.

Os filmes: Um Passaporte Húngaro, de Sandra Kogut, registra os processos burocráticos para conquista de um passaporte da mesma nacionalidade de seus avós. Em 33, nos tornamos detetives junto ao realizador Kiko Goiffman, na busca de encontrar sua mãe biológica, que dura exatos trinta e três dias. Já em Edifício Master e O Prisioneiro da Grade de Ferro, o olhar se desloca, a motivação da busca está no outro. Enquanto no primeiro os moradores da famosa residência carioca estão em foco, o segundo revela uma rotina incessante, conformando uma imagem múltipla do presídio, construída pelos próprios detentos.

Está no Estado de Minas de ontem, 04/05/2009:


A TRADIÇÃO CINEMATOGRÁFICA apresenta documentário e ficção como compartimentos estanques – o primeiro comprometido com o registro do real, a última voltada para a criação de uma nova realidade ou, no máximo, a reconstituição de uma realidade que deixou de existir. Os pesquisadores de cinema, contudo, afirmam que a distinção entre as duas categorias é mais nebulosa do que gostaríamos: todo documentário conteria algum elemento ficcional (mesmo que apenas o fato de que não registra seu objeto, mas o objeto que seu diretor pretende contar ou narrar), enquanto qualquer obra de ficção conteria, em si, algum registro documental (mesmo que apenas o fato de que certas pessoas, em certos momentos, executaram certas ações que resultaram objetivamente naquele filme). A mostra Documentários de busca, que será apresentada no Cine Humberto Mauro (Palácio das Artes) até dia 12, reúne quatro filmes brasileiros que se destacam por testar aquela fronteira.

Duas obras começam a ser exibidas a partir desta segunda-feira: Um passaporte húngaro, de Sandra Kogut (17h30), e 33, de Kiko Goifman (21h). Amanhã, entram em cartaz, também, Edifício Master, de Eduardo Coutinho, e O prisioneiro da grade de ferro, de Paulo Sacramento. Os quatro filmes se alternam na programação ao longo de toda a mostra, o que permite aos espectadores confrontá-los e tentar descobrir por que o Brasil tem sido tão pródigo na produção de obras que levantam aquele questionamento. Parte da explicação está, possivelmente, na exuberância atual do conjunto da produção documentária brasileira, que se destaca não apenas pela diversidade dos objetos que investiga, mas também pela experimentação de novas formas de investigação.

Dos quatro filmes, 33 é o mais radical. O diretor detesta quando alguém menciona o fato de que seu documentário tem afinidade conceitual com reality shows como Big brother Brasil, por registrar uma realidade que foi produzida especialmente para ser documentada. Mas a percepção de tal afinidade é verdadeira, e a qualidade de 33 vem exatamente do fato de que ele concentra, expõe e radicaliza aquilo que os reality shows diluem, disfarçam e suavizam.

Kiko Goifman, adotado na primeira infância, parte em busca de sua mãe biológica, e 33 é o registro dessa busca (o título do filme remete ao número de dias que ele se concedeu para cumprir a tarefa ou desistir dela). Se essa busca é fato do mundo “real” (e, portanto, objeto passível de ser registrado documentalmente), constitui, também, algo próximo da ficção, no sentido de que foi produzido exatamente para que o filme pudesse ser realizado. (Marcelo Castilho Avellar)

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+ Sobre documentários neste blog:
Edifício Master – a solidão no meio da metrópole
Waldick – Durango Kid à brasileira
Leon Hirzsman – Deixa que eu falo
Estamira – O olhar que tudo pode ver e tudo pode revelar

+ da Mostra
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segunda-feira, dezembro 08, 2008

Leon Hirszman - Deixa que eu falo...


Responsável pela organização e relançamento da obra de Leon Hirszman, o montador Eduardo Escorel não poderia ter escolhido forma melhor de homenagear o diretor, morto em 1987: Deixa que eu falo – exibido no Forumdoc.bh, ainda não lançado em circuito comercial –, destaca-se pela riqueza de imagens de arquivo, que ditam por si só o andamento do documentário.

O título foi escolhido para que Escorel não se colocasse na posição de narrador onipresente sobre a vida e obra de um amigo tão íntimo. O subterfúrgio narrativo foi atribuir ao próprio Leon as coordenadas, em uma espécie de documentário póstumo. Para isso, Escorel resgatou entrevistas e arquivos pessoais do diretor e “deixou que ele falasse”.

Segundo o diretor, o documentário não teve roteiro e foi construído a partir da pesquisa de material. Tratando-se de um exímio montador, Escorel organiza 70 minutos de filme com fragmentos que fogem da própria realidade e filmografia de Hirszman: para falar da chegada da família de Leon ao Brasil, utiliza trechos de O Imigrante (Chaplin, 1917), para citar a relação do diretor com os grevistas do ABC Paulista, evoca imagens de A Greve (Eisenstein, 1924).

Deixa que eu falo se destaca por falar muito em pouco tempo. É uma viagem ao mais íntimo de Leon Hirszman – um dos mais importantes nomes da cultura brasileira e um dos fundadores do Cinema Novo –, sem cair no lugar comum de tantos documentários biográficos.
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+ Cinema Novo neste blog:
- Breve biografia diGlauber
- Clássicos do cinema brasileiro: Vidas Secas
+ Vídeos
- Assista ao curta Partido Alto, dirigido por Hirszman, em 1982
- Assista ao trailer de Eles Não Usam Black Tie, de 1981
+ Leon na rede
- Site oficial do diretor

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domingo, dezembro 07, 2008

Agrippino nas Panaméricas de Áfricas utópicas


José Agrippino de Paula deixa qualquer cinema alternativo dito ‘underground’ no chinelo. Comparado às suas produções, Sganzerla e o cinema marginal tornam-se Hollywood. Assisti um de seus filmes há poucas semanas: Hitler terceiro mundo, de 1968, uma obra futurista e visionária, fragmentada em blocos desconexos, com direito a Jô Soares, em papel de samurai, e participação de Zé Ramalho.

Aliás, tudo parece de vanguarda em Agrippino: seja no teatro, no cinema ou em seu mais conhecido livro: “PanAmérica”, de 1967, relançado pela Editora Papagaio. Essa obra de contracultura tem como protagonistas Marilyn Monroe, Che Guevara, Cecil B. de Mille, Marlon Brando John Wayne, entre outros ícones da cultura de massa. Eles participam de uma filmagem de episódios da Bíblia, interagindo com o narrador em primeira pessoa em uma atmosfera alucinógena.

Morreu ano passado, aos 69 anos, de infarto, em Embu, onde morava envolto de livros antigos, traças e teias de aranha, recluso e sem qualquer ligação com a tecnologia.

Fiz esse post para linkar um excelente curta sobre o autor. Abaixo em duas partes.

Passeio nos recantos silvestres – Parte 1



Passeio nos recantos silvestres – Parte 2



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+ Autores do cinema brasileiro neste blog
O cinema gritante de Ana Carolina
+ Agrippino na rede
Veja: Leia o perfil de Agrippino
Revista Trópico: Ficção contracultural brasileira
Folha de S. Paulo: Takes impressionistas



segunda-feira, junho 23, 2008

Durango Kid à brasileira

De uísque em uísque, o cantor Waldick Soriano, de 75 anos e incríveis 18 ‘casamentos’, se tornou o protagonista cult da noite de sábado do CineOP. Compositor de mais de 700 canções, Waldick é uma mistura de presente e passado, de fragilidade e solidão, sob à penumbra da idade e de seu inseparável chapéu.

A principal noite do CineOP (Mostra de Cinema de Ouro Preto) parece ter virado um bom terreno para personalidades que se aventuram a sentar na cadeira de diretor. Em 2007, a Vj Marina Person (MTV) usou o mesmo espaço para lançar Person, uma homenagem a seu pai, o cineasta Luis Sérgio Person, diretor de São Paulo S.A (1965). Este ano foi a vez da atriz Patrícia Pillar, que mostra seu primeiro trabalho atrás das câmeras com “Waldick: Sempre no meu coração”, sobre a história e as histórias do cantor brega Waldick Soriano, já com 75 anos.

Considerando as primeiras incursões em direção de cinema, Patrícia Pillar se saiu melhor. Desconstruiu o perfil machão de Waldick, não deixou o roteiro cair em um simples biografismo e usou o tempo a seu favor: em 58 minutos de filme, foi capaz de dosar o sentimentalismo quase inexistente do cantor com seu excesso de sarcasmo e mau humor.

O filme já começa com algumas evocações ao tempo. Waldick volta a sua terra (Caitité, BA) natal para um show. Nas primeiras cenas, a câmera percorre detalhes do cantor e de objetos que dão pistas sobre sua forte personalidade: o terço, o anel, o chapéu. Os planos das estradas, das ruas e da chuva são sempre mais longos. Outra característica: ao contrário de documentaristas viciados, que teimam em dar grandiosidade ao seu personagem, Patrícia coloca a câmera sempre em linha reta. Desta forma, se põe a desmistificar seu protagonista, dando-lhe ares mais humanos.

Os depoimentos de ex-mulheres de Waldick são de grande emoção. No total, foram 18 mulheres e apenas uma paixão: uma ex-prostituta paraense, que morreu quando o casal completava apenas dois meses. E o espantoso: mesmo com as queixas de amor não retribuído todas ainda são apaixonadas pelo cantor e o aceitariam de novo.

Por fim, o documentário se presta a divulgar não só o personagem, mas toda a cultura marginal brasileira. Vários cantores populares sofreram com a censura nos anos de chumbo e muitos, mesmo com músicas que a princípio pareciam inofensivas, eram politizados e não escondiam sua opção pela democracia. Waldick foi mais brasileiro que muita gente da nossa “cultura popular brasileira”. Foi lavrador, garimpeiro, engraxate e se apaixonou, à primeira vista, ao ver o chapéu e a imponência do personagem Durango Kid nos cinemas. Sob o mesmo chapéu, hoje, Waldick é uma mistura de presente e passado, de fragilidade e solidão.

Leia mais sobre:

Revista Cinética – É tudo verdade

Filmes Polvo comenta estréia de Waldick

Veja cenas do documentário Waldick: para sempre no meu coração

Fique por dentro:

A Mostra de Cinema de Ouro Preto (12 à 17 de junho) chegou à sua terceira edição ainda sem a chancela de grande festival. No entanto, a programação foi bem mais acertada do que a de 2007, que homenageou Nelson Pereira dos Santos. Desta vez, Glauber Rocha e Rogério Sganzerla foram as personalidades lembradas. Além de "Waldick", de Patrícia Pillar, a mostra abriu espaço para outras estréias, como "Diário de Sintra", de Paloma Rocha (filha de Glauber), e "Os desafinados", ficção de Walter Lima Junior, em comemoração dos 50 anos da Bossa Nova.



domingo, junho 17, 2007

Edifício Master - Solidão no meio da metrópole



"Edifício Master, ao trazer o homem comum, simples e banal para as telas nos faz pensar nas vidas, histórias e personagens que se encontram dentro de cada estreito apartamento na imensa selva vertical em que vivemos nas grandes metrópoles".

O cinema é uma arte que nasceu na cidade e ao longo do século XX foi responsável por retratar as transformações de suas formas de organização. Ao contrário da pintura e da fotografia que imortalizam a paisagem, a sétima arte usou da capacidade de captar imagens em movimento para documentar o nascimento das grandes metrópoles. Ao trazer o homem comum para as telas – principalmente, após o neo-realismo italiano -, o cinema foi responsável por estreitar ainda mais a relação entre homem e espaço urbano, integrando-o na sua paisagem como construtor subjetivo da própria cidade, dando alma ao lugar que habita.

Edifício Master, do diretor Eduardo Coutinho (Cabra marcado para morrer, 1984), retrata a organização por excelência das grandes cidades: o edifício. Coutinho pretende mostrar, com a performance de seus entrevistados, como a cidade esconde a existência humana atrás de seus emaranhados de arranha-céus. Fechados em apartamentos conjugados, esses moradores apresentam duas contradições características das sociedades pós-modernas: a solidão no meio do tumulto, do caos e a estreita relação entre anonimato e visibilidade.

Para retratar esse sufocamento, o documentário é fechado e as únicas imagens externas são feitas no começo do filme. Dos minutos seguintes até o final, a equipe transita entre os corredores dos 12 andares de 36 apartamentos cada. A geometria dos corredores, das portas, dos apartamentos conjugados estabelece a idéia de uma sociedade disciplinar. E a disciplina é abordada nas primeiras entrevistas do filme exaltando a presença do novo síndico que afastou a prostituição e as “casas de massagem” do edifício.

A câmera é, quase sempre, fixa e as entrevistas são o eixo dramático exclusivo. A seleção das entrevistas dá prioridade aos depoimentos auto-reflexivos, misturando trechos de silêncio e testemunhos dos moradores contando segredos, experiências, emoções e sentimentos . Uma metáfora destes testemunhos é a música cantada pelo morador Henrique, My Way (meu caminho), de Frank Sinatra.

Quanto a sua estrutura, Coutinho parece provocar e botar em discussão a própria veracidade do documentário na entrevista com Alessandra, uma garota de programa, moradora de um dos conjugados. Ela se assume como uma “mentirosa verdadeira” e diz que se pode mentir mesmo dizendo a verdade. Com a permissão de Coutinho, Alessandra evoca uma discussão presente desde as primeiras exibições de cinema: É possível recortar e retratar a realidade através do cinema, reproduzindo a imagem tal qual ela seria sem a interferência da câmera?

Eduardo Coutinho defende a impossibilidade de filmar o real, que está em constante transformação. O que se filmou nas semanas que a equipe esteve presente no edifício foi a realidade interagindo com a câmera e o diretor. A câmera transpassa a realidade, as imagens são fílmicas, mesmo não sendo estabelecidas por roteiro. A equipe aparece nas cenas desde sua entrada, filmada pela câmera de segurança do prédio.

O comprometimento de Coutinho não é com a veracidade dos depoimentos e sim de tirar a câmera da posição do simples voyerismo e levá-la à reflexão crítica da nossa sociedade. Edifício Master, ao trazer o homem comum, simples e banal para as telas nos faz pensar nas vidas, histórias e personagens que se encontram dentro de cada estreito apartamento na imensa selva vertical em que vivemos nas grandes metrópoles.

_A imagem pertence ao site sllepycity.net
_Assista um trecho do documentário Edifício Master

segunda-feira, novembro 06, 2006

Estamira: Esta mira, o olhar que tudo pode ver e tudo pode revelar

A intenção inicial do diretor Marcos Prado (co-produtor do premiado Ônibus 174) era filmar as transformações do aterro sanitário Jardim Gramacho, em Duque de Caxias, destino de 85% do lixo produzido na cidade do Rio de Janeiro.O processo duraria sete anos, até conhecer uma das 2000 pessoas que, diariamente, garimpavam objetos velhos e restos de comida no aterro. A senhora de 65 anos, semi-analfabeta, de pele morena e o rosto marcado pela idade e trabalho possuía uma vontade incomum de se expressar.Seu nome: Estamira, ou como afirma a própria protagonista , “A Estamira”.

Renan Damasceno

O diretor poderia ter se rendido a editar o filme mostrando apenas os momentos lúcidos desta senhora, mas perderia a essência, acabando por apenas mitificá-la. Ao contrário, explorou o discurso ora rancoroso, ora doce, mas sempre enfático da personagem. Ela é perturbadora porque é capaz de gerar sentimentos de desconforto, mas também de admiração, por isso nos afeta.

A fotografia é outro ponto forte – no início, uma filmagem manual em preto e branco contrapondo-se ao colorido digital do restante do filme - e juntamente com a trilha sonora proporciona momentos de poesia no cenário caótico e putrefato do lixão.A alvoroçada dança dos urubus sobre os restos de animais mortos e a briga de dois cachorros por uma boneca são algumas das cenas , minuciosamente, observadas pela lente das câmeras.O que poderia ser tachado, simploriamente, como estética da miséria, nos fascina pela excelente combinação entre as imagens e o discurso místico da catadora de lixo.

Os minutos iniciais do filme são uma sobreposição confusa de imagens e palavras desconexas. É a apresentação da personagem Estamira, dotada de falas sem sentido, algumas vezes, indecifráveis. Sua personalidade parece única, mas ao longo do filme se revela como milhões. Mulher, feiticeira, doce, raivosa, louca, lúcida.Todos temos um pouco de Estamira. Todo o caos do lixão, dos urubus, do mar agitado é uma metáfora de seu pensamento desordenado e inclassificável, aparentemente ilógico.

A razão de seu distúrbio pode ter explicação em sua vida. Aos 12, é levada para um prostíbulo pelo próprio avô, que a estuprava desde muito cedo. Aos 17, casa-se com um italiano com quem teve sua primeira filha. Vêm em seguida várias traições, brigas violentas, novos casamentos e novos filhos. Depois de ser fortemente violentada, revolta-se com a religião e com Deus: centro de seu discurso e que provoca descontrolada ira ao ter o nome mencionado.

Após longos minutos de frases sem sentido lógico começa a permear palavras de grande potência filosófica que criam conceitos e definem modos de pensar. O “trocadilo”, o “controle remoto”, os “espertos ao contrário” e os “astros negativos” são os mais citados. ”Minha missão, além de ser a Estamira, é revelar a verdade, somente a verdade, capturar a mentira e jogar na cara”. Suas falas são dotadas de profecias que definem sua prepotência, como a única pessoa que sabe da existência do “além dos além”, que cientista nenhum conhece.

A perturbação de Estamira não é uma doença mental, pois como ela mesma afirma que “doente mental é aquele que é imprestável”. Seu discurso é marcado por uma peculiar lucidez e um conhecimento que não é aquele aprendido na escola, “lugar onde tudo se copia”, o que a distancia do “comum”.Ao manter esse distanciamento, Estamira consegue ver o que ninguém vê: a degeneração do homem que produz a desigualdade, a violência e se oprime rendendo devoções a Deus, que o castiga. Segundo ela, quem presta esta devoção está “contaminado pela doença da terra”.

Seu pensamento não é menos verossímil e legítimo que muitos disseminados no “mundo normal”. Se suas palavras não são reconhecidas como tal, é porque Estamira é uma outsider, faz parte da comunidade dos que vivem “do lado de fora”, que sobrevivem de “restos e descuidos”, à mercê da sociedade, que deles nada quer saber. Viver do lixo não é motivo de desgosto, ao contrário, Estamira gratifica e faz de Gramacho sua casa, onde criou fortes laços de amizade. Isto faz com que o filme não caia no lugar comum, sendo uma simples denúncia da miséria. Se há denúncia, é do descaso, não apenas social, mas existencial.

segunda-feira, julho 31, 2006

Música - Buena Vista Social Club

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Buena Vista Social Club é a reunião dos grandes nomes da música Cubana das décadas de 60 e 70. O álbum produzido pelo estadunidense Ry Cooder conta com a presença de Ibrahim Ferrer, Eliades Ochoa, Omara Portuondo, Rúben Gonzalez, Campay Segundo entre outros.
Na volta de Cooder à Havana para gravar o álbum solo de Ibahim Ferrer, o cineasta Win Wenders o acompanhou lançando o documentário homônimo vencedor de 10 prêmios internacionais e indicado ao Oscar 2000.
Este doc. gravado pelas ruas de Havana mergulha na história da cultura musical cubana e no universo fidelista mostrando o ostracismo no qual esses músicos foram submetidos ao longo dos anos.Uma viajem pela Cuba atual que relembra seu passado, revivendo através da música, uma cultura esquecida que de repente surge através deste projeto.

+ Buena Vista na Internet
Site Oficial: www.pbs.org/buenavista/