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segunda-feira, agosto 03, 2009

Kubrick e o futebol


Segundo o mapa-mundi azul e amarelo no canto esquerdo da tela, cerca de 25 internautas visitam o Moviola diariamente. Número baixo comparado ao estrelado da blogosfera, porém espichado diante da falta de atualização e divulgação desta página. Nada mal. No entanto, minha popularidade cai por terra quando abro minha conta do Google Analytics - serviço de estatísticas de pageviews gratuito - e descubro que, pelo menos metade destes flaneurs digitais, chegam até aqui através de combinações estranhas e desconexas de palavras lançadas ao Google.

O programa de buscas, segundo estatísticas, registra em torno de 23 mil procuras por segundo. no mundo inteiro Meu blogue, desde seu primeiro post, em 2005, abriga 116 extensos textos, com uma infindável gama de palavras. Isso quer dizer que abocanho uma dízima irrisória dos perdidos no espaço cibernético.

A palavra-chave que mais remeteu internautas ao meu endereço no último ano foi "Kubrick Futebol", assim mesmo, as duas juntas, colocando lado a lado, no ataque do Moviola, o aclamado diretor e o centenário esporte bretão.

Certamente, a ligação mais próxima entre os dois é o termo Laranja Mecânica, título da adaptação para o cinema do romance homônimo de Anthony Burgess feito por Kubrick, em 1971, empregado na mesma década para rotular a seleção holandesa, comandada pelo maestro Cruijff. No futebol, a seleção flamenga revolucionou ao implantar um esquema tático que atacava e defendia em bloco, trocando passes em grande velocidade. No cinema, Clorkwork Orange talvez ainda seja a representação máxima das películas de ultraviolência.

Neste blog, as duas palavras se misturam na crítica que escrevi sobre a filmografia do diretor para o Delphos, em 2006 (partes I, II, III). Cruijff, sem os outros 10 da imbatível seleção holandesa de 1974, é citado na matéria sobre atletas que se aventuraram nos palcos depois de pendurar as chuteiras. O exímio dote vocal de Cruijff é comparado a de outros gênios da música mundial, como Pelé, Marcelinho Carioca e Maguila.


segunda-feira, dezembro 03, 2007

Kubrick - O filósofo do cinema visual (I)

Renan Damasceno

*Especial para a coluna "Tremendões" do site Delfos

Poucos diretores conseguiram construir ao longo do tempo uma filmografia tão densa e autônoma quanto Stanley Kubrick (1928-1999). Perdoem-me os novos aficionados e admiradores dos cinemas “alternativos”, que lotam as salas em sessões de cineclubes, que insistem em estabelecer uma linha que divide o “cinema comercial” do “c
inema de arte”. Mas se há essa linha, Kubrick, assim como Alfred Hitchkock, Billy Wilder..., caminhou sobre os dois trilhos: financiado por grandes produtoras que não interferiram na genialidade e autonomia da obra.

De temperamento difícil e avesso à mídia, esse estadunidense do Bronx (NY) sempre dirigiu o que lhe parecia interessante – vide os hiatos entre suas produções, mais visíveis nas últimas obras. Seu início de carreira como fotógrafo da revista Look define a característica do seu cinema: profundamente visual, com planos longos e exaustivamente repetidos na gravação até alcançar a perfeição. A câmera é o próprio olho do diretor que vigia cada passo do ator e cada milímetro da cena.

(Ao ver seus filmes, imagino que nenhum plano poderia ser filmado sem ser daquela maneira, tamanha a precisão. Kubric trabalha, essencialmente, com o não “verbalizável”, o que nos permite sentir a imagem e a música”).

Sua filmografia não é extensa. De Fear and desire (1953) ao controverso e criticado Eyes wide Shut (De olhos bem fechados, 1999) foram 13 filmes, sendo O grande Golpe (1956) seu primeiro longa-metragem expressivo. Com uma narrativa não linear, o filme é considerado influência para obras como Pulp Fiction (de Quentin Tarantino,1994) e outros filmes do “neobrutalismo”, ( décadas de 80/90).

Em 1957, lança Glória Feita de Sangue, considerado por muitos o melhor filme sobre a Primeira Guerra de todos os tempos, estrelado por Kirk Douglas. Após ordenar um ataque suicida, o general do grupo escolhe três soldados que vão ser condenados à morte. Kubrick viaja pelo lado humanista, pelos rostos dos combatentes e denuncia os absurdos e as insanidades da guerra. O zoom, comum em suas obras, nos aproxima dos soldados e mergulhamos em seus sentimentos, fato inédito em filmes de guerra.

Spartacus (1960) é um filme épico e o primeiro de grande orçamento dirigido por Kubrick. Após o abandono do diretor original, Anthony Maan, a escolha do seu nome à direção, o confirma entre os grandes diretores de Hollywood e, a partir deste, sua característica de perfeccionista obsessivo.

Se a obra literária de Vladimir Nabokov é considerada um dos maiores romances do século XX, a adaptação de Kubick para o clássico Lolita (1962) esteve à altura. Mesmo sendo menos “quente” e mais cômico que o livro, Lolita é o espetáculo da regressão e da decadência do homem. A cena da morte de Clare Quilty - com uma brilhante atuação de Peter Sellers - , atrás do quadro, nos primeiros minutos do filme, é o retrato da falência da cultura européia e da sociedade contemporânea. A paixão do erudito escritor Humbert Humbert por uma garota de 14 anos é a prova da Impotência do ser humano, preso ao desejo sexual.

domingo, novembro 18, 2007

Kubrick - O filósofo do cinema visual (II)

De 1964 à 1971, Kubrick criou suas três obras primas: De viés político, criticou ácida e comicamente a Guerra Fria em Dr. Strangelove (1964); no ano em que o homem pisou na lua pela primeira vez, lançou 2001: Uma odisséia no espaço (1969), provando a incapacidade do homem em dominar suas próprias criações. Sexo e ultraviolência fazem parte do cotidiano do sujeito sem identidade pós-moderno, representado de Alex Delarge, em Laranja Mecânica (1971)

Doutor Fantástico (1964) é considerado por muitos críticos o início da segunda fase das obras de Kubrick. Já estabelecido na Inglaterra, desde a produção de Lolita, seu novo filme marca a passagem do cinema de caráter “humanista” para a fase da exploração dos mistérios humanos.

Dr. Fantástico é um clássico do humor negro, da crítica ao militarismo, à corrida armamentista e à banalidade em que os chefes de estado atribuem à guerra. Os bastidores da Guerra Fria são expostos e, por conseqüência, a total desmistificação do poder. Peter Sellers é, simplesmente, genial no papel de três personagens (um deles, o próprio Doutor Fantástico, um médico alemão que não consegue controlar seus extintos nazistas na cadeira de rodas, contorcendo-se todo para não saudar o presidente americano com a mesma predestinação que saudava seu fuher).

((Considero esse filme essencial para a cinemateca de qualquer cinéfilo. É visível o caráter crítico e peculiar que o diretor enxerga a humanidade e consegue adaptar para as telas os mais falhos extintos do Ser)). Em Dr. Fantástico, a relação homem-máquina é proposta pelo diretor e retomada no filme seguinte. Se em 2001: Uma Odisséia no Espaço (1968) a máquina Hal 9000 substituiria os erros humanos, como a máquina perfeita que nunca comete falhas, a bomba construida pelo doutor Fantástico foge ao controle do homem, que nada pode fazer para impedir a bomba de destruir o planeta. A humanidade passa a ser vítima de sua própria criação.

Enigmático, revolucionário, impecável. Muitos são os adjetivos que podemos atribuir à obra-prima do cinema de ficção-científica 2001: Uma Odisséia no espaço. Não somente é o maior filme de ficção científica de todos os tempos, como a obra que redefiniu o gênero. Originalmente criado em 70mm o filme era pra ser assistido em Cinerama, uma espécie de tela em 180º que daria a sensação do espectador mergulhar na história, desde o átomo até o universo (Se na tela da Tv já ficamos fascinados, imagine dentro do filme).

A evolução (ou não-evolução) do homem, desde o macaco que descobre a ferramenta até o astronauta que se aventura pelo universo é marcada pela presença do enigmático monolito negro. Ele determina o tempo e a história, sua aparição sempre representa alguma mudança na evolução da espécie no planeta. A inteligência humana é substituída pela máquina Hal 9000. Em 2001, os homens pouco têm personalidade, inclusive, no filme, o único personagem carismático é o computador Hal. Único que fala de assuntos relacionados a sentimentos, mesmo afirmando não possuir algum. A máquina é superior aos falhos astronautas, mas mesmo assim oferece total obediência aos tripulantes da nave. A falha do computador é um mistério, é impossível deduzir se Hal detectou um erro em seu funcionamento ou sua atitude foi proposital. Mas uma vez o homem torna-se refém de sua própria criação.

Os planetas parecem movimentar-se ao som da música e os planos longos definem uma viajem visual única na história do cinema. É impossível não se impressionar com o universo de 2001.

Laranja Mecânica (1971) completa a trilogia de obras geniais de Kubrick. É o retrato do sujeito da pós-modernidade, uma não-identidade que se libera na violência e no sexo. Nada mais primitivo. Alex DeLarge (numa brilhante atuação de Malcom McDowell) é o líder de uma gangue de “drugues” , e sua principal diversão é a prática da violência e ouvir Beethoven, o que exemplifica a mobilidade do sujeito.

Com a inviabilidade das leis, no século XXI, novas formas de tratamento serão testadas.Alex será vítima de um tratamento de choque que cura a violência com a exibição exaustiva de cenas de própria violência. São tirados do homem os seus impulsos naturais, tornando-o um objeto vazio. Kubrick faz análises sociológicas e filosóficas impiedosas para o futuro do ser humano. O grande número de simbolismos no filme é prova disso. Um ser pós-moderno que vive da inconstância, da identidade móvel e do hedonismo.

A exibição do filme foi proibida na Inglaterra a mando de Kubrick, em resposta à avalanche de crítica recebida pelo excesso de violência.

sexta-feira, novembro 16, 2007

Kubrick - O filósofo do cinema visual (III)

A imprevisibilidade é característica na filmografia kubrickiana. Pois, do violento e polêmico Laranja Mecânica ao romântico Barry Lindon (1975) são apenas quatro anos.

A beleza plástica de Barry Lindon é única.Os planos se retirados do vídeo são verdadeiros quadros, pintados pelo perfeccionismo de Kubrick. O filme todo foi realizado com iluminação natural, descartando qualquer auxilio de luzes artificiais, inclusive nas cenas à luz de velas. É uma viajem pelo século XVIII ao som de Bach, Mozart e Schubert... Barry Lindon é a história da ascensão e queda de um charlatão, amante dos duelos, do jogo e da vida boêmia. Mesmo sendo um de seus filmes mais belos, é um dos menos divulgados.

Cinco anos mais tarde foi incumbido a Kubrick a adaptação da obra “The Shinning”, de Stephen King. O trabalho não agradou o autor do livro, porém
O Iluminado (1980) faz o expectador mais cético cobrir-se até o pescoço e rezar o pai-nosso antes de dormir. Não há quem não se lembre da expressão ensandecida de Jack Nicholson. O filme aposta no clima claustrofóbico, na profundidade psicológica e na lenta metamorfose da mente de Nicholson, atormentado por forças malignas.

Apesar de uma excelente direção e roteiro, a produção beirou o fracasso, sendo reavaliado pela crítica tempos mais tarde. Nas filmagens, Kubrick usou um total de 390 000 metros de película para um filme de 142 minutos, que gasta, em média, 2.800 metros.Uma média de 102 takes por plano, enquanto a média normal é de 10 takes. Foi usado apenas 1% do material filmado no produto final. (Acho que depois desses números ninguém mais discordará quando falo em perfeccionismo).

O grande sonho de Kubrick era dirigir um longa-metragem sobre Napoleão. Era fixado pela vida do imperador francês. Não o fez. Sete anos mais tarde, resolveu dirigir um filme sobre a guerra do Vietnã. Nada original, pois já haviam sido produzidos Platoon e mais uma dezena. Nada original se o filme não tivesse o padrão Kubrick de qualidade. Nascido para matar (1987) é uma crítica ao absurdo da guerra e à viciosa estrutura norte-americana. Mostra, como nenhum outro filme, o processo de transformação dos jovens recrutas em máquinas de matar sem escrúpulos. A mesma expressão de loucura de Jack Nicholson, em O Iluminado, é percebida no rosto do jovem destruído pelo absurdo dos campos de treinamento.A guerra é a ruína da sociedade e do psicológico, despedaçado e desfragmentado pelos seus horrores.

Todos imaginavam a aposentadoria do diretor. Já havia dirigido, ao menos, dois dos maiores filmes da história do cinema e seu nome figurava ente os maiores gênios da sétima arte.Discretamente vivendo na Inglaterra, longe da mídia e do glamour hollywoodiano, era difícil prever sua volta.

Porém, dez anos após o lançamento de Nascido para matar, Kubrick volta aos estúdios para as filmagens de Eyes Wide Shut (1999). A produção durou quase três anos, obrigando o casal de protagonistas, Tom Crise e Nicole Kidman, se estabelecerem na Inglaterra durante os 18 meses de filmagens. Mesmo a história sendo passada em Nova York, todas as cenas foram filmadas em solo inglês, inclusive as cenas de externas, reproduzidas em estúdio.

O filme volta a explorar um tema pouco abordado pelas obras kubrickianas: o sexo. Um casal, aparentemente perfeito, mergulha nos seus desejos individuais.A infidelidade não é representada apenas no plano físico (no ato de trair), mas no psicológico, explorando as fantasias e a busca de cada um pelo labirinto enigmático do desejo.

De olhos bem fechados (título do filme no Brasil) ficou abaixo das expectativas dos fãs e foi vítima do circo armado ao redor da volta de Kubrick e da sua extensa produção.

_________________________Kubrick faleceu em 7 de março de 1999, antes da estréia de sua última obra. O diretor tinha a característica de alterar seus filmes mesmo dias antes da estréia, o que deixa a dúvida em todos os fãs sobre o final de Eyes Wide Shut. A Warner Bros, produtora de seus filmes, afirma que o filme é 100% Kubrickiano. Mas se Kubrick sempre tratou os extintos mais primitivos do ser humano com especial atenção, nada melhor que encerrar sua filmografia com a maravilhosa Nicole Kidman sussurrando o verbo: “To Fuck”.

Aos apocalípticos e aficionados por teorias obscuras de plantão, Kubrick faleceu 666 dias antes da chegada do ano de 2001, o ano da odisséia no espaço.

O diretor foi indicado a 13 Oscar (um pelos efeitos especiais em 2001, três como produtor, quatro como roteirista e cinco como diretor) entre outros prêmios pelo mundo pela sua contribuição à história do cinema.

FILMOGRAFIA

1. Fear and desire (1953)
2. A morte passou por perto (1955)
3. O grande golpe (1956)
4. Glória feita de sangue (1957)
5. Spartacus (1960)
6. Lolita (1962)
7. Doutor Fantástico (1964)
8. 2001 – Uma odisséia no espaço (1968)
9. Laranja mecânica (1971)
10. Barry Lyndon" (1975)
11. O iluminado" (1980)
12. Nascido para matar (1987)
13. Eyes wide shut (1999).

Renan Damasceno, 04/2006 - 10/2007