sexta-feira, março 27, 2009

Fim de semana – Tostão por Chico Buarque


Chico é torcedor do Fluminense. E, como todo fanático tricolor, tem sempre na ponta da língua a histórica escalação do seu time...”Castilho; Píndaro, Pinheiro...”, escrete dos anos 1950, encorpado por ídolos como Telê e Didi.

Apesar da paixão e devoção ao clube das Laranjeiras, o compositor admira gênios de outras cores: diz que aprendeu a amarrar as chuteiras com o rubro-negro Zizinho e elege Canhoteiro, do outro tricolor, o paulista, o melhor ponta-esquerda que já viu jogar.

Na série de DVD’s que lançou em 2000, Chico dedica um dos filmes ao futebol. No primeiro da série, “Chico e as cidades”, o músico faz pequena homenagem às peladas de campo de terra batida e conversa com o jornalista Fernando Calazans (de O Globo) e com Tostão, centroavante campeão mundial em 1970, no México.

Pela precisão cirúrgica na análise do futebol, as colunas do Dr. Eduardo (nome que Tostão voltou a usar ao encerrar prematuramente a carreira nos gramados e estudar medicina) são uma das minhas leituras obrigatórias. Como atleta, o vi jogar em reprise de algumas partidas da Copa do México e pelo Cruzeiro, na conquista da Taça Brasil de 1966 – desbancando a hegemonia de meia década do Santos, de Pepe e Pelé. Na final contra o alvinegro, marcou o quarto gol da goleada por 6 a 2.

Para não estender por laudas o assunto, segue abaixo o texto de Chico em homenagem a Tostão:

"Na minha mesa, Tostão virou botão. Eu já era bem crescido quando ele apareceu e fica um pouco ridículo fazer botão de jogador mais novo que você. Eu vi Tostão deslizar nos gramados e sem querer demerecê-lo era mesmo homem de braços e pernas. Nem por isso há de nascer um centroavante que se compare, como nunca haverá ponta-esquerda igual a Canhoteiro, que só eu vi jogar.

Desde já discordo de quem, concordando comigo, sustenta que o futebol era bem mais bonito no passado. Ao contrário de nós, mortais, que éramos todos mais bonitos no passado, os craques do passado são ainda melhores hoje. Penduraram as chuteiras, mas a permanente edição da nossa memória vão produzindo novos lances memoráveis. Tostão não fazia idéia dos gols que continua a marcar dentro da minha cabeça."
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Canal 100: Imagens líricas do futebol
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quarta-feira, março 25, 2009

Cine-mundi - Romênia (ou: Sob a sombra de Ceausescu)


Está em cartaz no Palácio das Artes, de 23 de março a 7 de abril, a mostra Cinema Romeno Atual, com a exibição de três longa-metragens de importantes realizadores contemporâneos. Bem aceitos pela crítica e observado com bons olhos pelos principais festivais, A Leste de Bucareste (2006), Como Eu Festejei o Fim do Mundo (2006) e 4 meses, 3 semanas e 2 dias (2007) representam a melhor fase do cinema da Romênia – que, antes disso, só havia conseguido prestígio internacional com A floresta dos enforcados, de Liviu Ciulei, na década de 1960.

Considerando os intensos conflitos étnicos da região, salpicados pelas reviravoltas políticas desde a II Guerra Mundial – o Leste europeu permaneceu sob domínio soviético até 1989 –, não surpreende que as produções significativas tenham hiatos de décadas. Assim como o próprio Balcãs, a indústria cinematográfica está se recontruindo, o que reflete no enredo dos seus longa-metragens. Produz, hoje, cerca de 15 filmes por ano.

O cinema dos países que ficaram sob o domínio do regime até 1989 – principalmente os produzidos nos Balcãs e na Polônia, que são bem parecidos – ainda sofrem com a sombra soviética. Ainda são melancólicos, escuros e frios, que tentam rir da vida com pitadas de humor seco e ingênuo, como em A leste de Bucareste. Já os dramas pessoais são permeados por incertezas, erros e medo, a exemplo da protagonista Otília de 4 meses, 3 semanas e 2 dias. Aliás, o filme de Mungiu é essencial em tempos de discussão sobre a liberação do aborto. Assista e tire suas conclusões.

Seja comédia de costumes, dramas individuais ou narrativas inusitadas, as histórias mostram uma nova Romênia, que tenta se desvencilhar de seu passado. O moderno tenta caminhar pelas ruas escuras, pelos prédios em frangalhos e, de vez enquando, se esbarra em algum caco das estátuas de Stálin e Ceausescu derrubadas no fim da década de 1980.

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+ Cine-mundi neste blog

Cine-mundi: Polônia (08/07/2005)
Cine-mundi: Peru (20/10/2007)
Cine-mundi: Bolívia (09/12/2008)
Cine-mundi: América Latina (13/05/2008)


+ Sobre cinema na Romênia

Programação completa da Mostra
Crítica: Estadão - 4 meses, 3 semanas e 2 dias
Crítica: Estadão - A leste de Bucareste
Crítica: Contracampo - Como festejei o fim do mundo

quinta-feira, março 19, 2009

Futebol e segurança pública

A cinco anos da realização da segunda Copa do Mundo no Brasil – a primeira foi em 1950 –, a segurança dentro e fora dos estádios emerge como principal preocupação do governo e da CBF. Ficar atento aos gastos com infra-estrutura e ao jogo de interesse de cartolas e autoridades é essencial para evitar que um rio de dinheiro público seja consumido e afogue o contribuinte.

A primeira atitude tomada (à custa da morte de dois torcedores nos últimos clássicos estaduais em São Paulo e em Belo Horizonte) é o controverso cadastro nacional de torcedores. Até agora a promessa é que o fã de futebol não precisará desembolsar nenhum centavo pela carteirinha, obrigatória a todos a partir do ano que vem. Basta esperar para saber quem vai pagar a bagatela.

O cadastramento não seria necessário se as leis fossem respeitadas e as medidas contra vândalos, enérgicas. Não será uma catraca na porta de estádio que inibirá a ação de animais que se transvestem de torcedores em dia de jogo como álibi para cometer crimes contra a sociedade e patrimônio público. A solução já temos, resta aplicá-la. Ou parece mais cômodo gastar milhões? (Renan Damasceno).


Está no editorial da Folha, de 15/03/09:

QUANDO CARTOLAS e autoridades se reúnem para promover uma Copa do Mundo no Brasil, ao cidadão, em especial na condição de contribuinte, é recomendável dose extra de desconfiança. A ideia agora é implantar um cadastro nacional de torcedores, que seria condição necessária para ter acesso aos estádios de futebol.

Boas intenções, como sempre, não faltam.

O propalado objetivo da medida é ampliar a segurança nas partidas de futebol. De posse de um cartão magnético contendo suas digitais, só torcedor "ficha-limpa" seria admitido depois da checagem numa catraca ultratecnológica; quem deve à Justiça seria barrado.

Ao que consta, contudo, poucos se puseram a verificar se, para atingir a pacificação nos estádios, é mesmo necessária tamanha elucubração cibernética. De saída, o método escolhido pelos dirigentes inverte a lógica: em vez de fichar apenas os suspeitos, os torcedores violentos, ficham-se todos. Além disso, barrar a entrada de uma pessoa num evento público porque ela não tem um "cartão de torcedor" parece abertamente inconstitucional.

Outro aspecto intrigante do projeto é que ele não fala em custos. Implementar o cadastro nacional, imprimir milhões de cartões magnéticos e instalar catracas "inteligentes" nos estádios não é barato.Mas o governo promete que a carteirinha sairá de graça para o torcedor.

Pretende destinar dinheiro dos impostos à aventura? Que suspeitos de sempre serão beneficiados com o monopólio da impressão de carteirinhas e outras facilidades?

A experiência internacional demonstra que a violência nos estádios se combate com ações convencionais das autoridades policiais e judiciárias e com um mínimo de adaptação nas leis penais. A receita é identificar os arruaceiros e bani-los das partidas de futebol -para sempre, nos casos mais extremos.

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Entrevista: José Roberto Torero
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Especial: Como os grupos de investimento atacam o futebol
Canal 100 – Imagens líricas do futebol
O fatídico dia em que eles resolveram trocar de palco


terça-feira, março 17, 2009

Frase...

"Você só escreverá bem se desfrutar a liberdade de poder experimentar várias formas de contar uma história, e de tempo para amadurecer um estilo. Se não lhe permitirem errar e bancar o ridículo , e se você não admitir ser criticado, o mais provável é que você jamais escreverá algo que preste".

Ricardo Noblat

quarta-feira, março 11, 2009

Dita o quê?

Durante uma década e meia, a Folha ficou sob o comando da direita golpista e muitos dos seus jornalistas ocuparam cargos na Secretaria de Segurança Pública de São Paulo

Está no jornal paulistano Brasil de Fato desta semana:

O editorial da Folha de S.Paulo da semana passada, que qualificou a sanguinária ditadura militar brasileira de “ditabranda”, foi um tiro no pé. Em pleno carnaval, serviu para tirar sua fantasia de jornal eclético e plural, que até hoje engana alguns ingên uos. A balela publicitária de que a Folha “tem o rabo preso com o leitor” foi para o esgoto. Em poucos dias, dois mil leitores indignados assinaram um manifesto de repúdio ao jornal. Eduardo Guimarães, do blog Cidadania, já propõe realizar um ato de protesto em frente ao prédio do Grupo Folhas, na Rua Barão de Limeira.


Da própria redação, o jornalista Fernando de Barros e Silva resolveu se indignar - infelizmente, a maioria mantém o silêncio cúmplice: “Certamente não é a primeira vez que um colunista da casa diverge da posição expressa pelo jornal em editorial. Mas é a primeira vez que este colunista se sente compelido a tornar pública sua discordância... O mundo mudou um bocado, mas ‘ditabranda’ é demais. O argumento de que, comparada a outras instaladas na América Latina, a ditadura brasileira apresentou ‘níveis baixos de violência política e institucional’ parece servir, hoje, para atenuar a percepção dos danos daquele regime de exceção”.

Indignação e silêncio cúmplice – “Algumas matam mais, outras menos, mas toda ditadura é igualmente repugnante... Se é verdade que o aparelho repressivo brasileiro produziu menos vítimas do que o chileno e o argentino, isso se deu porque a esquerda armada daqui era menos organizada e foi mais facilmente dizimada, não porque nossos militares tenham sido ‘brandos’. Quando a tortura se transforma em política de Estado, como de fato ocorreu após o AI-5, o que se tem é a ‘ditadura escancarada’, para falar como Elio Gaspari”, reagiu o editor de política da Folha na sua coluna desta terça-feira, dia 24.

É certo que Fernando de Barros dá uma no cravo e outra na ferradura, enfatizando sua concepção liberal. Democracia política sim; democracia social, nem tanto. Como ele registra, o seu protesto se dá “em nome do que aprendi durante 20 anos de Folha”. Demarcando com os que aderiram ao manifesto de repúdio, ele ataca gratuitamente Cuba, Venezuela e “os figurões e as figurinhas da esquerda nativa” com a sua “retórica igualitária” – por ironia, o mesmo argumento utilizado pela ditadura para não ser nada branca no Brasil. Apesar deste escorregão liberal, entretanto, ele pelo menos resolveu se indignar com o odioso editorial da Folha. Melhor do que o silêncio cúmplice.

“O diário oficial da Oban” – Na onda de repúdio à postura fascistóide da Folha também ressurge sua história sinistra. O livro de Beatriz Kushnir, “Cães de guarda”, renegado pelos resenhistas quando foi lançado em 2004, agora aparece como uma obra indispensável para se entender as íntimas ligações da mídia com o regime militar. Com 404 páginas, ela é resultado da tese de doutorado da historiadora carioca e foi aprovada com louvor na Unicamp. Com base em documentos oficiais e entrevistas, Kushnir prova o “colaboracionismo” dos veículos privados e de muitos jornalistas, que se tornaram “cães de guarda” da ditadura, encobrindo seus crimes e justificando o seu projeto político-econômico.

A autora dedica longo capítulo à Folha de Tarde, o principal jornal da Famíglia Frias nos anos de chumbo da repressão. Editado na época por Antonio Aggio, que depois foi assessorar o senador Romeu Tuma, ex-chefe da Polícia Federal, o jornal virou “o diário oficial da Oban” – a Operação Bandeirantes, que torturou e assassinou vários patriotas. Ele desqualificou os que lutaram contra a ditadura – Lamarca era rotulado de “louco” –; ignorou a morte do jornalista Wladimir Herzog; não deu destaque à prisão de Frei Betto, que fora da sua equipe de reportagem; e transmitiu a versão oficial sobre mortos e desaparecidos – como o do ex-metalúrgico Joaquim Seixas.

A mudança tática do discurso – Durante uma década e meia, a Folha ficou sob o comando da direita golpista e muitos dos seus jornalistas ocuparam cargos na Secretaria de Segurança Pública de São Paulo. Tanto que passou a ser ironizada como o jornal de “maior tiragem” devido à forte presença de “tiras” (policiais) na redação. Com o fim do regime militar, a Folha da Tarde entrou em declínio e faliu; seu lugar foi ocupado pela Folha de S.Paulo. A famíglia Frias tentou esconder seu passado sujo e reciclar seu discurso. Numa entrevista ao jornal Unidade, do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, Kushnir afirma que esta mudança foi tática – a empresa nunca abandonou suas posições de direita.

“Em 1977, o Boris Casoy assumiu a redação da Folha. São tirados todos os nomes dos Frias do expediente, que só vão ser recolocados no jornal em 1984, na época das Diretas. É toda uma jogada de marketing da Folha. Se você repensar hoje o Projeto Folha, ela está muito longe de qualquer análise que diga: ali tínhamos uma redação neutra. Mas as pessoas continuam lendo o projeto Folha como isso. Como um momento em que a Folha vai sair de tudo isso como se nada desse passado tivesse a ver com a família Frias, e vai entrar limpar para a história nesse momento de redemocratização do país, o que não é verdade”.

Agora, com o editorial da “ditabranda”, a Folha retoma sua verdadeira história e tira a máscara!

domingo, março 01, 2009

O destino em um lance de dados


Quem quer ser um milionário? mereceu o Oscar. É original, sensível e não cai no lugar comum de apenas denunciar a miséria terceiromundista – aí, a principal diferença com Cidade de Deus. O filme faz bem mais que isso ao mostrar a luta diária dos habitantes destes lugares inóspitos para fugir da própria realidade, a todo custo.

D
ar a volta por cima é o objetivo dos irmãos Salim e Jamal, cada um ao seu jeito. O primeiro, o mais velho, toma o mesmo rumo de tantos outros jovens miseráveis. Munido de arma de fogo, conquista o poder, o respeito e o sexo da jovem Latifa – paixão do irmão mais novo, que se torna, anos mais tarde, um simples servidor de chá em um call center de Munbai.

Quis o destino, num simples coup de dés (e ‘um lance de dados não abolirá o acaso’, segundo Mallarmé), colocar Jamal no programa mais popular do país. E, novamente, tão fugaz quanto a jogada, por acaso, Jamal responde às perguntas, mesmo semi-alfabetizado.
Tudo bem. Água com açucar. Mas o pecado é redimido pela costura bem feita do filme, que tem como cenário a contrastante Munbai, dividida entre a alta tecnologia e as favelas de terra encharcada pelo esgoto a céu aberto.

O Curioso caso de Benjamin Button tinha os ingredientes certos para angariar o principal prêmio do cinema: atores renomados, roteiro adaptado de um dos escritores mais querido dos americanos, figurino impecável e ótima fotografia. Mas não levou. A Academia, assim como todo o mundo lá de cima, parece bem disposta a dialogar com os BRIC’S.

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+ Slumdog Millionaire na rede
Baixar o filme Quem quer ser um milionário?
+ Cinema americano x Terceiro mundo
Diamante de Sangue: A áfrica hollywoodiana