Está no jornal paulistano Brasil de Fato desta semana:
Da própria redação, o jornalista Fernando de Barros e Silva resolveu se indignar - infelizmente, a maioria mantém o silêncio cúmplice: “Certamente não é a primeira vez que um colunista da casa diverge da posição expressa pelo jornal em editorial. Mas é a primeira vez que este colunista se sente compelido a tornar pública sua discordância... O mundo mudou um bocado, mas ‘ditabranda’ é demais. O argumento de que, comparada a outras instaladas na América Latina, a ditadura brasileira apresentou ‘níveis baixos de violência política e institucional’ parece servir, hoje, para atenuar a percepção dos danos daquele regime de exceção”.
Indignação e silêncio cúmplice – “Algumas matam mais, outras menos, mas toda ditadura é igualmente repugnante... Se é verdade que o aparelho repressivo brasileiro produziu menos vítimas do que o chileno e o argentino, isso se deu porque a esquerda armada daqui era menos organizada e foi mais facilmente dizimada, não porque nossos militares tenham sido ‘brandos’. Quando a tortura se transforma em política de Estado, como de fato ocorreu após o AI-5, o que se tem é a ‘ditadura escancarada’, para falar como Elio Gaspari”, reagiu o editor de política da Folha na sua coluna desta terça-feira, dia 24.
É certo que Fernando de Barros dá uma no cravo e outra na ferradura, enfatizando sua concepção liberal. Democracia política sim; democracia social, nem tanto. Como ele registra, o seu protesto se dá “em nome do que aprendi durante 20 anos de Folha”. Demarcando com os que aderiram ao manifesto de repúdio, ele ataca gratuitamente Cuba, Venezuela e “os figurões e as figurinhas da esquerda nativa” com a sua “retórica igualitária” – por ironia, o mesmo argumento utilizado pela ditadura para não ser nada branca no Brasil. Apesar deste escorregão liberal, entretanto, ele pelo menos resolveu se indignar com o odioso editorial da Folha. Melhor do que o silêncio cúmplice.
“O diário oficial da Oban” – Na onda de repúdio à postura fascistóide da Folha também ressurge sua história sinistra. O livro de Beatriz Kushnir, “Cães de guarda”, renegado pelos resenhistas quando foi lançado em 2004, agora aparece como uma obra indispensável para se entender as íntimas ligações da mídia com o regime militar. Com 404 páginas, ela é resultado da tese de doutorado da historiadora carioca e foi aprovada com louvor na Unicamp. Com base em documentos oficiais e entrevistas, Kushnir prova o “colaboracionismo” dos veículos privados e de muitos jornalistas, que se tornaram “cães de guarda” da ditadura, encobrindo seus crimes e justificando o seu projeto político-econômico.
A autora dedica longo capítulo à Folha de Tarde, o principal jornal da Famíglia Frias nos anos de chumbo da repressão. Editado na época por Antonio Aggio, que depois foi assessorar o senador Romeu Tuma, ex-chefe da Polícia Federal, o jornal virou “o diário oficial da Oban” – a Operação Bandeirantes, que torturou e assassinou vários patriotas. Ele desqualificou os que lutaram contra a ditadura – Lamarca era rotulado de “louco” –; ignorou a morte do jornalista Wladimir Herzog; não deu destaque à prisão de Frei Betto, que fora da sua equipe de reportagem; e transmitiu a versão oficial sobre mortos e desaparecidos – como o do ex-metalúrgico Joaquim Seixas.
A mudança tática do discurso – Durante uma década e meia, a Folha ficou sob o comando da direita golpista e muitos dos seus jornalistas ocuparam cargos na Secretaria de Segurança Pública de São Paulo. Tanto que passou a ser ironizada como o jornal de “maior tiragem” devido à forte presença de “tiras” (policiais) na redação. Com o fim do regime militar, a Folha da Tarde entrou em declínio e faliu; seu lugar foi ocupado pela Folha de S.Paulo. A famíglia Frias tentou esconder seu passado sujo e reciclar seu discurso. Numa entrevista ao jornal Unidade, do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, Kushnir afirma que esta mudança foi tática – a empresa nunca abandonou suas posições de direita.
“Em 1977, o Boris Casoy assumiu a redação da Folha. São tirados todos os nomes dos Frias do expediente, que só vão ser recolocados no jornal em 1984, na época das Diretas. É toda uma jogada de marketing da Folha. Se você repensar hoje o Projeto Folha, ela está muito longe de qualquer análise que diga: ali tínhamos uma redação neutra. Mas as pessoas continuam lendo o projeto Folha como isso. Como um momento em que a Folha vai sair de tudo isso como se nada desse passado tivesse a ver com a família Frias, e vai entrar limpar para a história nesse momento de redemocratização do país, o que não é verdade”.
Agora, com o editorial da “ditabranda”, a Folha retoma sua verdadeira história e tira a máscara!
2 comentários:
Parabéns!
Elogiosa essa sua posição de usar esse espaço para divulgar um fato importante e que, ao meu ver, não foi divulgado como deveria. [Porque será, sic!]. Ficou restrito ao méio intelectual que manifestou o seu repúdio...
Caiu a máscara da Folha e dos Frias, apesar de que, na verdade, isso faz um certo tempo...
Parabéns!
Abraço,
Sofista Minimus.
CACILDS!
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